Autonomia e suas contradições: inquietações da prática profissional

Por Aline Morais  Ao pensar no trabalho social com famílias, nos objetivos de nossas ações, em um deles temos sempre acordo: promover autonomia. O que é mesmo isso? Por que os usuários da assistência precisam disso, o que lhes falta? Uma demanda (não sei bem se dos usuários, ou dos técnicos) que tem me inquietado, advém de algumas situações comuns entre algumas famílias que chegam ao CRAS, as quais imagino que com os colegas também: “problemas” com higiene (da casa, pessoal, dos filhos, etc). Chegam demandas das escolas, do Conselho Tutelar, da Saúde. Casa extremamente suja e desorganizada, crianças sujas ao chegar à escola, famílias que acumulam materiais recicláveis para venda, entre outros tantos. Assim, até que ponto tais questões configurariam negligência? Ou problema de saúde pública? Ou ainda, até onde podemos interferir no ‘funcionamento’ familiar? Quem somos nós para dizermos: “arrume sua casa”, limpe melhor o seu filho ou a si mesmo? São questões com as quais tenho me deparado, tendo a certeza de que essa questão é extremamente delicada e requer muita reflexão antes da ação. Requer cuidado, na medida em que temos lutado para nos desfazer do ranço higienista e do controle das famílias pobres que a assistência carrega em sua história. Além disso, o que deve ser levado em consideração não é o desejo do profissional, mas as necessidades das famílias, certo? Muitas perguntas e poucas respostas. Procurei materiais acadêmicos que pudessem ofertar algum suporte sobre tais questões, mas não encontrei nenhum material relacionado diretamente a discussão da higiene na assistência social (se alguém tiver, por favor, compartilhe!). Uma frase que me marcou naquele documentário “O ciclo da vida” (super indico!) foi de uma entrevistada que disse não acreditar em negligência, pois cada um dá aquilo que tem. Diante disso, entramos no campo das escolhas e nã0-escolhas (sobre a qual Lívia falou lindamente neste post ⇒“Você vai trabalhar no SUAS”: considerações sobre uma não-escolha) e, consequentemente, sobre autonomia. Sempre que penso em autonomia, me vem uma compreensão de que se trata da possibilidade de escolher, mediante as oportunidades e as não-oportunidades. Nesse caso, acho que um bom exemplo é um garoto que cometeu ato infracional. Vejo que no imaginário social tal atitude transgressora é vista como uma escolha. Contudo, antes disso, é necessário pensar que para escolher, é preciso ter alternativas. Quais as alternativas que se apresentaram de chances de vida para este jovem? Veja bem, vai além do debate de que ele é vítima (das mazelas sociais) ou autor. Estamos aqui falando de autonomia. Ou seja, antes de se promover autonomia, devem-se ter chances de escolhas, opções. E, há que se considerarem os aspectos micro e macrossociais envolvidos. Assim, percebo que falamos em autonomia de uma forma banalizada, como se fosse um conceito dado e autodefinido, ou ainda, um objetivo facilmente alcançável. Para ele, existem diversas definições. Segundo documento recente que aborda sobre o Trabalho Social com Famílias, autonomia é a “capacidade do indivíduo de eleger objetivos e crenças, de valorá-los com discernimento e de pô-los em prática sem opressões” (BRASIL, 2016, p.20 apud PEREIRA, 2000). Sposati (2013) traz algumas reflexões críticas a respeito do modo de proteção social brasileiro, o qual acaba por expressar uma dependência dos sujeitos, em contraponto a uma autonomia a ser exercida pelo indivíduo, estimulando seu espírito ‘empreendedor’. Para autora, a autonomia tornou-se um argumento neoliberal, o qual pretende desfazer da condição de sujeitos dependentes da assistência, para que exerçam autonomia, sendo, na realidade, a “ocupação remunerada de mão de obra, para que o beneficiário se transforme em provedor de sua própria proteção” (p.657). A crítica dela vem do tratamento diferenciado entre proteção social contributiva e não contributiva, sendo esta última tratada ainda como um ‘favor’ e não um direito.  Nesse cenário, é necessário olhar para as entrelinhas e pano de fundo da Política de Assistência Social, notando que a autonomia encontrará espaço na contra-hegemonia, na luta pelos direitos. Ela se manifestará quando o usuário disser para o técnico que cuidará de sua casa e de seus filhos como quiser, com aquilo que tem (de repertórios e vivências). Nem sempre a conquista da autonomia irá nos agradar como técnicos, ela poderá vir a partir do embate, do questionamento, do posicionamento, das escolhas possíveis. Com isso, é preciso deslocar o olhar da norma e da disciplina, para estar em uma ação técnica relacional. Assim, talvez poderemos identificar quais os limites de nossas ações. Promover autonomia também pode significar recusar algumas atitudes, enquanto técnico. Quando eu estava executando uma oficina junto a idosos do SCFV, percebi que eles solicitavam que eu pegasse as tintas, os pinceis, e todos os outros materiais para conseguirem fazer a atividade proposta. Até a cor que iriam utilizar, pediam que eu escolhesse, e quando eu dizia “escolhe você”, alguns respondiam “tanto faz”. Neste momento, percebi que o que eu estava promovendo ali era quase o contrário da autonomia. E demorou para isso vir à consciência, não foi óbvio. Na tentativa de agradá-los, eu fazia o que me pediam. Portanto, é preciso estar atento e não cair na rotina de trabalho, para abrir espaço para essas percepções. A autonomia é aceitar no outro o que não entendemos, permitir sua participação nas suas próprias condições. Implica na capacidade dos sujeitos em criar e ampliar as suas vinculações, ter respeito mútuo, implicando em uma prática especial de troca. Governar a si próprios, sem imposições, decidir que atitudes tomar (LOPES, 2008), mesmo que seja uma “não-escolha”. Portanto, temos aqui algumas pistas de que não podemos cobrar respeito de pessoas que não foram respeitadas, ou cobrar escolhas ‘certas’ de quem não teve opções. Diante disso, ganha centralidade a necessidade de uma escuta qualificada, a respeito dos modos de vida, e, sobretudo, da alteridade. A alteridade implica reconhecer que o indivíduo existe em interação com o outro, valorizando as diferenças existentes e exercitando a empatia.  Segundo Barros (2004), é preciso que o técnico saiba redimensionar o próprio saber, saiba transitar em relações de alteridades sociais e culturais em suas ações.  Para concluir, percebo

Caderno de Orientações: A prevenção e o trabalho social com famílias na Proteção Social Básica -Sedese e AMM

Oi pessoal, compartilhando com vocês um caderno mineiro de orientações acerca da Proteção Social Básica lançado pela Secretaria de Estado de Trabalho e Desenvolvimento Social – Sedese, em parceria com a Associação Mineira de Municípios – AMM. Trata-se do Caderno de Orientações: A Prevenção e o Trabalho Social com Famílias na Proteção Social Básica.  De acordo com a apresentação do Caderno (pág.05), este material faz parte do material do Capacita SUAS e dialoga com as expectativas dos profissionais, dando subsídios e referências técnico-operativos para que possam desenvolver processos de trabalho voltados para a dimensão preventiva do trabalho social com as famílias. Sendo que o objetivo é retomar o debate sobre as funções de prevenção e vigilância socioassistencial exercida pela PSB e abordar: a gestão territorial e a utilização dos instrumentos informacionais do SUAS. Quando li a notícia de lançamento (Agosto de 2016 – sim, só agora estou conseguindo fazer este Post 😉 ) procurei muito para encontrar o caderno em PDF, contudo não salvei o endereço. Como já faz um tempo, não consegui localizá-lo novamente – se você souber e quiser informar o link de origem, ficarei grata e poderei disponibilizá-lo aqui como fonte. Mas como este Blog gosta mesmo é de propor leituras e estudos para nortear a prática, segue aqui o Caderno para download ⇒ caderno-de-orientacoes-a-prevencao-e-o-trabalho-social-com-familias-na-protecao-social-basica Bons estudos e um ótimo trabalho! 🙂

Um dedo de prosa: reflexões iniciais sobre o atual contexto histórico e os desafios do trabalho no SUAS

Queridos leitores, é com muita alegria e honra que completo, por ora, o time das colaboradoras do Blog Psicologia no SUAS. Fechando as apresentações, temos o primeiro Post da Thaís Gomes, assistente social. Seja muito bem-vinda, Thaís! <3 Por Thaís Gomes* Logo após tomar posse no concurso, ao saber que iria trabalhar na política pública de assistência social, especificamente no CRAS, senti aquele medo, comum a quem vai iniciar seu trabalho em um lugar novo (apesar de ser a assistência um lugar historicamente familiar aos assistentes sociais) e pensei: preciso ler, preciso me aprofundar na temática, buscar informações que subsidiem e qualifiquem o meu trabalho. Assim, nessa busca, encontrei o Blog Psicologia no SUAS, onde me senti acolhida em minhas inquietações profissionais e que foi um instrumento maravilhoso de aprendizado, abordando as questões pertinentes ao trabalho no SUAS de forma didática, crítica e propositiva, oportunizando os profissionais re-pensarem o fazer profissional através de muitas informações importantes e com uma troca de experiências muito interessante. Hoje, escrevendo este primeiro texto como colaboradora do Blog, representando também os assistentes sociais que atuam no SUAS, me sinto muito feliz, honrada e dotada de grande responsabilidade pela oportunidade de poder partilhar experiências, observações e reflexões sobre a prática profissional dos Assistentes Sociais na assistência social. Ao relacionar a política de assistência social e o Serviço Social temos um leque de assuntos relevantes que podemos abordar. Desse modo, pretendo inicialmente apresentar reflexões sobre a prática profissional do assistente social no SUAS, especialmente na PSB, questões sobre cultura política e os entraves postos a efetivação/funcionamento do SUAS no âmbito municipal, gestão da política e participação e controle social, com espaço aberto para sugestões de temas advindos dos colegas profissionais de Serviço Social e trabalhadores do SUAS de um modo geral. Dentre as tantas possibilidades de abordagem, penso ser de suma importância contextualizar o momento que vivemos em nosso país, após um impeachment presidencial, fruto de um golpe político, onde a partir daí vemos surgir uma forte onda de retrocessos, aos quais não compactuamos (e não devemos temer), expressa numa série de ataques aos direitos sociais, à seguridade social, com rebatimentos para a política de assistência social, na qual estamos inseridos enquanto trabalhadores do SUAS e como tal, considero que este seja um momento em que, mais do que nunca, temos que estar atentos e unidos na defesa da política de assistência social como política pública assegurada pela Constituição Federal, com legislação própria e estruturada a partir de um Sistema Único de Assistência Social. Unidos também pela garantia de nossos direitos trabalhistas, por valorização profissional e salarial, por condições objetivas de trabalho nos equipamentos tais como espaço físico adequado, materiais e recursos para andamento dos serviços, investimento em capacitação e educação permanentes dos profissionais, dentro outros que refletem diretamente na qualidade dos serviços prestados à população usuária.  Além, claro, sem esquecer da defesa e garantia dos direitos de nossos usuários, tal como preconizado na LOAS em seu Art. 1º onde a  “assistência social, direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas.” Há que se reforçar então, nesse contexto, o compromisso ético-político dos assistentes sociais, na defesa do SUAS, com o objetivo de contribuir para que este seja implementado em conformidade com o preconizado na legislação, em sua totalidade e não em ações isoladas, remetendo ao assistencialismo e ao favor, desvinculadas da noção de direito, que caminham para a desconstrução da política pública de assistência social e dos direitos sociais conquistados. São tempos de luta, tempos em que é necessário reconhecer que o trabalho é árduo e repleto de desafios, mas temos que ter a convicção de que é possível construir coletivamente alternativas, que muito avançamos em relação ao passado, mas que muito ainda precisa ser feito para que avancemos mais e mais e para isto todas as categorias atuantes no SUAS precisam estar engajadas na construção de propostas e organizadas na defesa do mesmo. Cientes então, dos desafios postos no atual contexto, da importância da discussão sobre ações na defesa do SUAS e dos direitos sociais e do necessário enfrentamento aos diversos ataques sobre os direitos dos trabalhadores em geral, convido a todos interessados no tema a refletir sobre as possibilidades de mudança, comprometidos com o aprofundamento e defesa da nossa democracia (tão recente e fragilizada), com a luta pela conquista de novos direitos e com a ampliação da cidadania. Referências: BRASIL. Lei Orgânica da Assistência Social, Lei n°. 8.742, de 7  de Dezembro de 1993. Dispõe sobre a organização da assistência social e dá outras providências. *Thaís Siqueira Gomes: Graduação em Serviço Social pela Universidade Federal Fluminense – UFF (2010). graduação em Gestão de Políticas Públicas de Assistência Social e Saúde pela Faculdade Governador Ozanam Coelho – FAGOC (2016). Assistente Social do CRAS no município de Conceição de Macabu – RJ desde junho de 2015. Contato: thais_uff@yahoo.com.br  .

Encontros e trocas profissionais: relato de uma experiência exitosa

Hoje é dia de dar as boas-vindas a mais uma colaboradora do Blog Psicologia no SUAS, Tatiana Borges*, representando os profissionais do Serviço Social. Presença que só me faz continuar acreditando na potência dos encontros! Gratidão pela sua presença, Tatiana! <3 Por Tatiana Borges Espaços privilegiados de reflexão da prática profissional, como o Blog de Psicologia do SUAS tem, entre tantas coisas, o poder de aproximar pessoas e foi justamente o que ocorreu com a autora e nós, assistentes sociais que trabalhamos pelo estado de São Paulo na regional de Franca que abrange 23 municípios. Há algum tempo acompanho as publicações e a familiaridade das análises, discussões e indicações contidas no Blog com as nossas atuações e construções no âmbito do SUAS é imensa. Destaco de uma forma especial o comprometimento profissional e pessoal da Rozana Fonseca com a efetivação da Política de Assistência Social que me chamou atenção desde o início, principalmente em suas participações em nossos momentos de trocas e diálogos no GECCATS (Grupo de Estudo e Capacitação Continuada das/os Trabalhadoras/es do SUAS) que, assim como o Blog, acaba dando vazão a tantas descobertas e angústias que emergem do cotidiano do trabalho técnico desta Política. Proporcional à minha admiração pelo Blog e Rozana é a honra e responsabilidade de contribuir, em alguns momentos, com este espaço representando a categoria da qual me orgulho em fazer parte, sobretudo pela imensa contribuição para o SUAS destas/es profissionais: as/os assistentes sociais. Fundamentadas pelo Código de Ética, que traz como princípio “o compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e com o aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência profissional”, nós, assistentes sociais, somos instigadas a ir além das rotinas institucionais para buscar apreender no movimento da realidade possibilidades presentes, transformando-as em projetos e propostas profissionais. (Marilda Iamamoto, 2016). É com esta escolha teórica que foi gestado o GECCATS, em um momento ainda bastante incipiente da institucionalização do SUAS no país, quando se buscava construir caminhos para a implantação efetiva dos CRAS numa região composta predominantemente por municípios de pequeno porte, onde a sensação de isolamento profissional é presente e os processos de capacitação são escassos. Uma das grandes motivações para a criação deste grupo de educação permanente foi à necessidade de nossa aproximação, enquanto técnicas da DRADS (Diretoria Regional de Assistência e Desenvolvimento Social) com as/os técnicas/os dos municípios, em um contexto de mudança indispensável de uma relação verticalizada para uma construção coletiva e horizontal, respeitando as atribuições institucionais de cada ente. O objetivo do GECCATS, desde a sua formação é propiciar um espaço de trocas de experiências, estudo e reflexão acerca das legislações e documentos de orientação, além de palestras informativas sobre a política de assistência social. Os encontros regionais acontecem mensalmente e são desenvolvidos temas específicos que buscam subsidiar a prática profissional das/os trabalhadoras/es do SUAS. Ao longo de 07 anos de existência, o modo de funcionamento do GECCATS foi se aperfeiçoando ao ponto de contar com um regimento interno construído coletivamente, no qual se define as condições necessárias para o cumprimento dos objetivos do grupo: participação, representação, forma de desenvolvimento dos temas, comissões, comunicação, avaliação, entre outras. Para cada encontro é instituída uma comissão organizadora composta por representantes de dois municípios da região administrativa e da equipe da DRADS em forma de rodízio, que divide as responsabilidades na organização e realização de cada encontro. Esta dinâmica de condução de atividades coletivas já se traduz em processos democráticos de participação que agregam à nossa competência profissional. Os assuntos discutidos nos encontros são definidos a partir das demandas e necessidades emergentes da prática profissional cotidiana, apontadas pelos membros do grupo e avaliadas como prioritárias pela maioria das/os participantes. Apesar de utilizar a estrutura da DRADS, o grupo não oferece demais ônus financeiro para o estado. Conta com a participação e coordenação de três técnicas da DRADS, Renata, Talismara e eu, todas assistentes sociais, que incorporamos esta atividade como parte da rotina diária de trabalho. Também são disponibilizados os equipamentos necessários para os encontros e os municípios apoiam o grupo no fornecimento do lanche e nas eventuais contratações de especialistas. Contudo, considera-se fundamental agregar investimentos financeiros direcionados para potencializar as ações do grupo. É possível afirmar que o GECCATS traz repercussões positivas para toda a região, pois, os profissionais que atuam na assistência social, principalmente nos CRAS, ganharam um espaço onde podem aprimorar os conhecimentos e desenvolver um trabalho mais assertivo que pode culminar na prestação de serviços com mais qualidade para os usuários, levando em consideração que o trabalho da assistência social está fortemente apoiado na formação técnica e política do seu quadro de pessoal. E por outro lado e de um modo particular, nós, técnicas da DRADS, executamos o papel atribuído ao estado de fomentar capacitações de atualização técnica, além de pactuar e disseminar conteúdos para os trabalhadores do SUAS. (CNAS, 2013). Termino com uma frase citada no último dia 05 no 15º Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais/CBAS de Chico Science & Nação zumbi que faz todo o sentido neste processo de aprimoramento profissional “Comecei a pensar, que eu me organizando, posso desorganizar, que eu desorganizando, posso me organizar…” Bibliografia: ·         Brasil. Código de ética do/a assistente social. Lei 8.662/93 de regulamentação da profissão. – 10ª. Ed. rev. e atual. – [Brasília]: Conselho Federal de Serviço Social, [2012]; ·         ——–. Resolução CNAS Nº 4, de 13 de março de 2013. Institui a Política Nacional de Educação Permanente do Sistema Único da Assistência Social – PNEP/SUAS; ·         https://www.youtube.com/watch?v=ytnbrnvTzC4 *Tatiana Roberta Borges Martins Possui pós-graduação em Gestão Pública pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCAR e graduação em Serviço Social pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2004). Atualmente é Servidora Pública e Diretora Técnica I do Núcleo de Avaliação e Supervisão da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social – Diretoria Regional de Assistência e Desenvolvimento Social – DRADS Franca. Tem experiência na Gestão da Assistência Social/SUAS pela trajetória profissional em Órgão Gestor (municipal e estadual), CRAS e Conselhos, desde 2005. É instrutora habilitada pelo Ministério de Desenvolvimento Social

“Você vai trabalhar no SUAS”: considerações sobre uma não-escolha

Por Lívia de Paula* Desde o início do meu trabalho neste espaço de colaboração, tenho tido a honra de ser orientada pelo professor André Torres, profissional significativo em minha formação como psicoterapeuta fenomenológico-existencial e que, ao mesmo tempo, possui uma prática que “conversa” bem com o campo social, tendo inclusive atuado pioneiramente na área e publicado sobre o assunto antes mesmo da consolidação do SUAS (TORRES, 2005)[i]. Uma de suas primeiras sugestões foi que eu contasse um pouco sobre o interesse pelo SUAS antes de efetivamente trabalhar nele. Em nosso último contato, ele me questiona: “Por que trabalhar no SUAS?” Confesso que fiquei profundamente incomodada com este questionamento, ou melhor, com a ausência de uma resposta para ele. De pronto pensei: não escolhi o SUAS. Fui escolhida por ele. Apesar de já ter uma trajetória marcada pelas disciplinas vinculadas à Psicologia Social, conforme abordei em meu último texto, quando iniciei como psicóloga da Prefeitura Municipal de Itaúna não foi me perguntado onde eu gostaria de trabalhar. Creio ser assim na maioria das prefeituras. É raro termos conhecimento de concursos específicos para determinada área de atuação dentro do escopo das secretarias existentes. “Você vai trabalhar no Serviço Sentinela”:  foi assim o meu encontro com o SUAS. Fui lançada nele. E este encontro, bastante inesperado e não planejado, já dura dez anos. Posso dizer então que essa foi uma escolha daquelas que acreditamos ser uma não-escolha.  Ao ser escolhida pelo social, eu também o escolhi. Como servidora pública efetiva poderia, diante de alguma insatisfação, pedir para ser transferida para outro setor. E até hoje não o fiz. Mesmo com a dureza cotidiana do trabalho que todos vocês, meus colegas de SUAS, conhecem muito bem, eu continuo lá. E conheço muitas pessoas que, assim como eu, também continuam. E daí eu refaço a nós a pergunta do meu orientador: Por que continuamos? Tendo me deparado com o incômodo e o desafio posto por esta questão, percebo que fiz dela minha companheira de percurso. Volta e meia, me pego pensando sobre isso. Curiosa que sou vivo em busca de novos desafios, novas tessituras. E isso inclui também, participar sempre de capacitações, congressos, espaços agregadores de novos conhecimentos. Escrevo este texto ainda no calor do último evento no qual estive presente: I Simpósio da Rede de Pesquisas em Narrativas, Gênero e Políticas; realizado nos dias 01 e 02 de setembro, na PUC Minas[ii]. Este simpósio congregou pesquisadores de todo o país e me possibilitou adentrar em um universo até então bastante desconhecido para mim. Fui bastante tocada pelos relatos de experiências e investigações. Uma das apresentações, feita pelo professor da Universidade Estadual de Maringá/PR Murilo Moscheta, me conectou instantaneamente com a pergunta que norteia este texto. De uma forma bastante inovadora e intensa, Murilo terminou sua contribuição se apropriando de uma fala de uma aluna sua, Eloísa Guerra, que “explicou” o porquê de continuar exercendo a profissão de professora, apesar de tantas dificuldades. Disse ela: “O que eu mais gostava ao fim de cada aula era o sentimento de indignação e a vontade de mudar o mundo que predominava em mim”. Sua fala reverberou profundamente em mim, como se me dissesse assim: é isso. A Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, em seu Capítulo I, art. 2º, Parágrafo único, dispõe que: A assistência social  realiza-se  de  forma  integrada  às  políticas setoriais, visando ao enfrentamento da pobreza, à garantia dos mínimos sociais, ao provimento de condições para atender contingências sociais e à universalização dos direitos sociais. Somos os profissionais dos quais se espera a operacionalização disto. É possível caminhar no sentido de enfrentar a pobreza, garantir mínimos sociais e universalizar direitos sem refletir sobre as exclusões deste mundo que vivemos? E aquela questão, minha companheira de percurso, começa a ser iluminada. O SUAS só pode ser um campo para os indignados: aqueles que esbravejam contra as desigualdades e injustiças que permeiam a vida dos nossos usuários, aqueles que esbravejam contra as dificuldades que permeiam a atuação dos trabalhadores do social. Podemos estar longe das transformações necessárias para a efetivação da política. Mas estamos no caminho. E acabo de descobrir que uma das coisas que me mantém nesse caminho é o sentimento de indignação e a vontade de mudar o mundo que continuam predominando em mim ao final de cada dia de trabalho. Obrigada André, obrigada Eloísa Guerra, obrigada Murilo! [i]  TORRES, A. R. R. A perspectiva existencial diante da comunidade carente de recursos socioeconômicos. In: Valdemar Augusto Angerami – Camon. (Org.). As várias faces da psicologia fenomenológico-existencial. 1ed. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005, p. 55-80. [ii] Se quiser saber mais sobre o evento, acesse o site: http://www.narrativas-genero-politica.org/ *Lívia de Paula colabora mensalmente com o Blog Psicologia no SUAS! Saiba mais sobre Lívia  AQUI e para os outros textos: AQUI

Primeiro-damismo: da desesperança à consciência da dor e alegria de se tornar cidadã

Tenho sentido o peso e a dor advindos do pouco de cidadania que sou capaz de exercer num País onde direitos sociais são tratados com descaso e instabilidade sob o discurso estólido e perverso de que são os responsáveis por desequilíbrios no orçamento público – porque não dizer que são tratados com violência institucional!  Como ficar indiferente a um processo onde tentam colocar, mais uma vez, a culpa nos pobres? como ficar indiferente num processo onde se legitima a corrupção daqueles que não sabem o que é ficar na fila do SUS, na fila do Cadastro Único, na escola com uma sala onde a temperatura chega a 36 graus, tendo mais de 50 alunos, onde caberia 30? E o que dizer da escória que embolsa o dinheiro público destinado à merenda escolar? A humilhação social deita e acorda com essa gente que eles insistem em desqualificar ao oferecê-los, sob a égide da bondade e da benemerência, o trabalho voluntário. O trabalho pautado no discurso romanceado de criança feliz. Um mero engodo para que estas crianças não sintam na pele a dor e a alegria de serem gente; de pertencerem ao mundo e constatarem que o mundo também as pertencem! Só vão sentir a dor de serem ‘ralé’, a dor por nunca serem cidadãs de bem o suficiente para agradecerem pela bondade da primeira-dama que se esforça num trabalho voluntário para salvá-las apontando, como única possibilidade, uma estética burguesa. Notícias como essa acima, que evidenciam esse ranço ainda tão dominante na nossa cultura, me trazem uma desesperança muito grande quanto as políticas sociais, e questiono o quanto podemos contribuir, de fato, nas políticas públicas. Apesar da desesperança bater (quase sempre 🙁 ), eu tenho ciência que sou uma cidadã/profissional muito melhor depois que ingressei no SUAS, e que há avanços sólidos na assistência social. Por isso, hoje, mesmo constatando que a consciência crítica também traz sofrimento, eu só quero confiar que terei coragem para continuar desafiando as leis que regem a invisibilidade ou manutenção da desigualdade social, porque como dizia o saudoso Marcus Vinicius, temos um único problema: a desigualdade social. E na rotina do trabalho nas políticas sociais, sabe-se que ela é a gênese de tantos outros. Não temerei a alegria de me sentir pertencente ao mundo, assim como não temerei as dores no árduo trabalho de transformação das relações que o fazem e que, consequentemente, me fazem!

Terapia Ocupacional, o social e a Assistência Social

Por Aline Morais Para iniciar, acredito que se faz necessário apresentar a Terapia Ocupacional no Campo Social, pressupondo que para alguns colegas eu não esteja trazendo nenhuma novidade. Contudo, acredito que para muitos outros profissionais seja pertinente evidenciar alguns caminhos traçados pela nossa atuação específica dentro deste campo. Comecemos com uma definição clássica da Terapia Ocupacional: um campo de conhecimento e intervenção em saúde, em educação e na ação social, que reúne tecnologias orientadas para a emancipação e a autonomia de pessoas que, por razões ligadas a problemáticas específicas (físicas, sensoriais, psicológicas, mentais e/ou sociais), apresentam, temporária ou definitivamente,dificuldades de inserção e participação na vida social. Fonte: Crefito3 Desde a década de 70, os terapeutas ocupacionais atuam no que se chama de “social”, contudo numa lógica histórica de inserção nas instituições totais (FEBEMS, asilos). Associados aos processos e movimentos de redemocratização do Brasil, os quais certamente influenciaram outras profissões, os terapeutas ocupacionais começaram a questionar o seu papel de “mantenedores da ordem institucional”. Interrogavam se realmente estavam contribuindo com o bem-estar dos sujeitos, ou apenas reproduzindo as lógicas institucionais segregatórias.  Ainda, com o aumento da pobreza e da desigualdade social, os terapeutas ocupacionais, que até então estavam mais ligados às problemáticas de saúde, passam a perceber outras demandas para a profissão. Além disso, inicia-se o questionamento por parte dos terapeutas ocupacionais acerca do papel político do técnico, influenciados por Paulo Freire, Franco Basaglia, Gramsci, Foucault, Robert Castel, entre outros, que criticavam e apontavam para a “medicalização dos problemas sociais”. Assim, após diversos processos históricos, políticos e sociais, a Terapia Ocupacional Social vem se constituindo com base em alguns princípios: o adoecimento como processo também social (crítica ao modelo biomédico), deslocamento do setting terapêutico para o território, descentramento do saber técnico ou individualizado para compreensão das demandas e saberes coletivos e o conceito de atividade como algo a ser construído a partir da alteridade (conceito emprestado da antropologia). No Campo Social, entendido como esfera interdisciplinar mais ampla, há diversos núcleos de atuação da Terapia Ocupacional, tais como o da educação, da justiça, da cultura e da assistência social (MALFITANO, 2005). Assim, a Terapia Ocupacional Social, não trata exclusivamente da atuação na Assistência Social, mas tem ofertado subsídios para discuti-la, na medida em que não parte dos referenciais de saúde, mas sociológicos, antropológicos e outros. Não posso deixar de me referir ao Laboratório Metuia[1], berço da Terapia Ocupacional no Campo Social, do qual pude fazer parte durante um período de minha formação e tem protagonizado ações de extensão universitária, pesquisa e formação neste campo. Graças à presença (e luta) dos terapeutas ocupacionais nas conferências e espaços participativos do SUAS, sobretudo no Encontro Nacional dos Trabalhados do SUAS em Brasília, em março de 2011, nossa profissão foi reconhecida como categoria que pode compor as equipes de referência e gestão dos serviços socioassistenciais, consolidada por meio da resolução n. 17 do CNAS/2011. Foi um grande passo, contudo, ainda temos os seguintes desafios: Conquistar cargos efetivos e concursos específicos para terapeutas ocupacionais no SUAS; Garantir a presença de disciplinas e estágios das graduações que oferte maior preparo para atuação desses profissionais no SUAS; Divulgar e promover as nossas possibilidades de atuação na Assistência Social. Para quem se interessar, há alguns materiais complementares que já foram divulgados aqui no Blog no Post: Terapia Ocupacional no SUAS. Optei correr o risco de ser redundante para quem já conhece essa história, para fazer uma apresentação bem resumida àqueles que ainda não nos conhecem como profissão. Compartilhando aqui uma experiência pessoal, que ainda trata dos nossos desafios, quando participei da X Conferência Estadual de Assistência Social, enquanto delegada, em uma discussão em subgrupo, uma colega assistente social questionou se eu compunha a equipe de referência, se era concursada e se poderia registrar ações técnicas no prontuário SUAS, insinuando que as respostas seriam negativas. Mediante tais questionamentos, a respondi, embasada na resolução n. 17 do CNAS/2011 e afirmando que sim, como qualquer profissional da equipe de referência. Para me reconfortar dessa situação, escutei uma fala de um professor Marcelo Gallo, (professor da Unesp Franca e graduado em Serviço Social) em uma de minhas formações do Capacita SUAS, em que ele alegou que, como assistente social ele poderia afirmar: assistentes sociais, a PNAS não é de vocês! Certamente, vindo de um colega assistente social, me senti representada! Diante disso, cabe a nós terapeutas ocupacionais, mostrar a que viemos. E aos colegas e gestores, também se informarem sobre as demais profissões previstas na NOB/RH, de modo que os serviços socioassistenciais possam contar com olhares profissionais diversos e complementares, não concorrentes! Para finalizar, àqueles que se interessarem em conhecer as origens da terapia ocupacional, deixo aqui a minha sugestão de assistirem ao filme brasileiro “Nise – O coração da loucura”. Ele ajuda a compreender as nossas bases para o uso da atividade, não apenas para “ocupar” ou manter a “ordem”, mas como forma de questioná-la, estabelecendo uma ordem própria (através do que chamamos de autonomia, assunto o qual pretendo discutir em outro momento) e produção de sentido. Assim, as dimensões da intervenção do terapeuta ocupacional devem ser a ampliação e o fortalecimento das redes sociais, bem como a expansão do repertório de atividades cotidianas. O objetivo final é aumentar a participação cívica e social dos sujeitos (COSTA, 2016). Referências COSTA, L.A. A terapia ocupacional no contexto de expansão do sistema de proteção social. In: LOPES, R.E., MALFITANO, A.P.S. Terapia Ocupacional social: desenhos teóricos e contornos práticos. São Carlos: EdUFSCar, p.135-153, 2016. LOPES, R. E. et al. Terapia Ocupacional no campo so­cial no Brasil e na América Latina: panorama, tensões e reflexões a partir de práticas profissionais. Cadernos de Terapia Ocupacional da UFSCar, São Carlos, v. 20, n. 1, p. 21-32, 2012. MALFITANO, A. P. S. Campos e núcleos de interven­ção na terapia ocupacional social. Revista de Terapia Ocu­pacional da USP, São Paulo, v. 16, n. 1, p. 1-8, 2005. [1] Grupo interinstitucional de estudos, pesquisa, formação e ações pela cidadania de crianças, adolescentes e adultos em processos de ruptura das redes sociais de suporte, sob os pressupostos

Você já foi picado pelo “bichinho” chamado Psicologia Social e Comunitária?

Por Lívia de Paula*    Em minha estreia¹ neste espaço, trouxe alguns questionamentos que sempre me acompanham no cotidiano de trabalho dentro da Política de Assistência Social. Tais questionamentos se referem a qual psicologia seria possível dentro deste campo de trabalho, a qual psicologia temos nos dedicado como trabalhadores do SUAS. Se estamos garantidos por lei dentro dos equipamentos da Assistência Social, estamos mais que convidados, estamos convocados a pensar como tem sido e como pode se dar nosso fazer junto às famílias. Assim, seja em um CRAS, CREAS ou demais equipamentos das proteções básica e especial, sempre haverá um profissional de Psicologia “fazendo” alguma coisa. E se já sabemos que não fazemos psicoterapia, mas estamos nestes locais fazendo alguma coisa, quero te perguntar: o que estamos fazendo? Já parou para pensar? Nosso “gueto” do SUAS sempre está a pontuar: nossa formação não nos preparou e talvez ainda não prepare nossos colegas estudantes para esta inserção na Assistência Social. Embora já existam disciplinas que abarcam a prática do psicólogo social em alguns cursos, a maioria ainda parece ter como foco a dobradinha “indivíduo – divã”. Mas, há algum tempo refletindo sobre isso, tal pontuação tem me incomodado. Claro, não há como negar que a maioria de nossas disciplinas possuem um viés clínico pautado no indivíduo e em sua psiquê. Mas, acredito que a maioria de nós tenha sim sido ao menos apresentado a disciplinas como: Dinâmica de Grupo e Instituições, Psicologia Social, Psicologia Comunitária, Saúde Coletiva, entre outras. Tais disciplinas me parecem essenciais para nortear nossa atuação, mesmo não abordando diretamente o funcionamento do SUAS e de seus equipamentos.  Será que, por não tratarem diretamente da Política de Assistência Social, acabamos nos esquecendo de seus ensinamentos? Além disso, creio que somos ou deveríamos ser profissionais que acreditam na possibilidade de transformação, de mudança das pessoas. E o mesmo não vale para nós? Se não me sinto preparado para atuar no campo, o que estou fazendo para mudar isso? Lembro da minha formação, da primeira aula como caloura de Psicologia: Dinâmica de Grupos. Não sei bem ao certo, mas talvez ali eu já tenha sido picada por este bichinho chamado Psicologia Social e Comunitária. Lembro-me afetivamente da professora Eloísa Borges, e a vocês peço licença para mencioná-la e agradecer pela delicadeza de nos emprestar os seus olhos para que pudéssemos desenvolver os nossos. Vieram outras disciplinas e estágios, onde pude exercitar o fazer da Psicologia junto a grupos e minorias. E aí, pronto. Me descobri encantada por este universo que hoje conduz minha prática no SUAS. Tive outros encantamentos durante a graduação. E como já pontuei o viés clínico tão enfatizado pejorativamente por nós do SUAS, é claro que ele também foi marcante em minha formação. E aí, no sétimo período, me vi flertando com a Psicologia Fenomenológico-Existencial. Entender o ser humano sem noções pré-concebidas, a partir do fenômeno, entendido como aquilo que se revela, que se mostra, isto é, “aquilo que aparece”. Esta é a proposta da fenomenologia. Você deve estar se perguntando: cabe no contexto do SUAS? A meu ver, O SUAS nos convida o tempo todo para esta postura fora da caixinha dos rótulos: acolher o que aparece, o inusitado e nos reinventar, sem roteiro predefinido construir intervenções a partir do que nos é dado pelos usuários. Por isso, mais que olhar pejorativamente para nosso viés clínico, proponho que prestemos atenção naquilo que esse viés pode trazer de contribuição para o nosso fazer. Não se trata de ser psicoterapeuta no contexto do SUAS, mas de refletirmos sobre como nossa formação clínica pode, conjugada aos ensinamentos da Psicologia Social, contribuir para a construção/invenção da nossa prática. Creio que seja necessária uma última reflexão. Uma reflexão mais individual e afetiva: você já se perguntou se seu coração bate pelo social? Pois não bastam as capacitações, cursos e livros se não tivermos prazer naquilo que fazemos. Se o nosso coração bate pelo social, deixemo-nos “picar” todos os dias pela Psicologia Social. E sigamos com a luta, lembrando da famosa e até batida frase de Jean-Paul Sartre, filósofo existencialista: “Não importa o que fizeram de mim, o que importa é o que eu faço com o que fizeram de mim.” Estamos no SUAS. E aí, o que vamos fazer com isso? Texto 1  [1]: Compartilhando vivências: vamos falar sobre nossa atuação na Proteção Social Especial? *Lívia de Paula – Graduada em Psicologia pela Universidade do Estado de Minas Gerais (2003). Possui formação em Psicoterapia Existencial e especialização em Violência Doméstica contra Crianças e Adolescentes. Foi membro do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (Gestões 2010-2012 e 2012 -2014). Atua na área de Assistência Social desde 2006. Atualmente é técnica de referência do PAEFI/CREAS de Itaúna/MG, psicóloga clínica, coordenadora do GT SUAS da Subsede Centro Oeste do CRP – MG e membro do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (Gestão 2016-2018). Contato: liviadepaulla@yahoo.com.br

Diálogos e perspectivas possíveis da Assistência Social com/e da Terapia Ocupacional

Hoje é dia de receber Aline Morais, que será colaboradora do Blog para abordar a atuação do profissional com formação em Terapia Ocupacional no SUAS. Seja muito bem-vinda, Aline. Estou muito feliz em ampliar esse espaço com suas reflexões e proposições! Este espaço também é seu e de todas/os Terapeutas Ocupacionais <3 Por Aline Morais * Estreio esse espaço privilegiado de “compartilhares” com uma grande responsabilidade: representar os terapeutas ocupacionais do SUAS. Represento porque atualmente trabalho no CRAS de Patrocínio Paulista, além disso, tenho me dedicado, desde o término da graduação ao Campo Social da Terapia Ocupacional, seja por meio da atuação prática (nas medidas socioeducativas), seja na academia (como docente, supervisora de estágio e mestranda). Sendo assim, espero dialogar, refletir, provocar questões pertinentes à Assistência Social, como um todo, atreladas às especificidades da Terapia Ocupacional. Contudo, além de mim, sei que há colegas terapeutas ocupacionais trabalhando no SUAS, com os quais espero contar para compor este diálogo que iniciamos neste importante espaço, concedido pela Rozana Fonseca (obrigada!). Imagino que muitos colegas ainda não conheçam as possibilidades de nossa atuação na Assistência Social. Há aqueles que pensam que somos uma profissão da saúde ou recente, em ascendência. O primeiro curso de Terapia Ocupacional surge no Brasil em meados da década de 1950, e a sua atuação no campo social, nos anos 70, quando começam a atuar em presídios, FEBEMs e programas comunitários. Ou seja, estamos há um tempo significativo na construção de um saber específico, sobre o qual pretendo contar a vocês durante nossas postagens. Pretendo me debruçar sobre as especificidades da profissão, contudo, além de TO, também sou profissional do SUAS e, com certeza, teremos inquietações similares, advindas da Assistência Social como um todo. Dentre elas, as discussões que inferem que o objeto de intervenção das outras áreas (como a da saúde) é mais claro, mais concreto, do que o da Assistência Social. Quantas vezes nos deparamos com essa discussão? Para nosso conforto, o novo documento do MDS, sobre o Trabalho Social com Famílias[1], aborda o fato de nosso trabalho ser de natureza relacional, que requer necessariamente o estabelecimento de uma relação entre profissional e usuário. E então, nos questionamos: qual o limite dessa relação? Queremos nos relacionar? Ou seja, a cada afirmação, um novo questionamento. E penso que é isso que nos move, enquanto profissionais que fazem a diferença no seu cotidiano de trabalho. A autonomia é um conceito que se coloca recorrentemente como objetivo de intervenção a ser alcançado, tanto pela Assistência Social quanto pela Terapia Ocupacional. Porém, como tal conceito se efetiva na prática, no relacional? Percebo que, facilmente entramos em contradição, enquanto profissionais, e seguimos no caminho contrário (com a melhor das intenções!). Sendo assim, se no cotidiano de trabalho não há um exercício de reflexão, seguido de um posicionamento, quase sempre, contra-hegemônico (crítico à realidade, ao senso comum e ao tradicional), facilmente reproduzimos aquilo que, na teoria, criticamos. Em alguns momentos formativos dos quais participei, discute-se muito que as atividades (artesanais e manuais) na Assistência Social devem sempre ter um objetivo, um propósito. Para os terapeutas ocupacionais isso sempre foi imperativo, plenamente discutido na graduação do curso, inspirada em uma terapeuta ocupacional[2] que dizia que a atividade naturalmente terapêutica (ou benéfica) seria um mito. Mito este relacionado a uma visão ultrapassada de que o trabalho dignifica.  É importante considerar que ele pode também gerar adoecimentos. Assim, a execução de uma atividade e o alcance de seus objetivos depende necessariamente do recurso humano. Uma mesma atividade pode ser utilizada para propósitos totalmente opostos.  Outra reflexão que tem se mostrado importante, é discutir sobre as formas de inserção dos trabalhadores do SUAS nos serviços. Sou concursada para o cargo de terapeuta ocupacional CRAS, contudo, a abertura de cargos específicos dessa forma é raro, senão inexistente. Portanto, há muitos pontos que pretendo levantar neste espaço, enquanto terapeuta ocupacional e trabalhadora do SUAS. Busquei expor aqui apenas uma prévia desse desafio enorme de transpor o entendimento analítico dos referenciais teóricos rumo às estratégias de intervenção prática e técnico-operacional. [1] BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Fundamentos ético-políticos e rumos teórico-metodológicos para fortalecer o Trabalho Social com Famílias na Política Nacional de Assistência Social. Brasília, 2016. [2] NASCIMENTO, B. A. O mito da atividade terapêutica. Revista de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo, v.1, n.1, p. 17-21, 1990. *Aline Cristina de Morais – Graduada em Terapia Ocupacional pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCar (2008), Mestre em Terapia Ocupacional pelo Programa de Pós-Graduação em Terapia Ocupacional da UFSCar – PPGTO (2013). Atuou no Serviço de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto (2008 a 2011) em São Carlos/SP. Foi professora substituta no Departamento de Terapia Ocupacional da UFSCar (2013-2014) e docente adjunta do curso de Terapia Ocupacional do Centro Universitário de Araraquara – UNIARA (2013-2015). Atualmente é Terapeuta Ocupacional do CRAS de Patrocínio Paulista/SP, membro do Conselho Municipal de Assistência Social de Patrocínio Paulista/SP (atual gestão) e membro do Grupo de Estudos e Capacitação Continuada de Trabalhadores do SUAS – GECCATS.

Cartilha da família com crianças e adolescentes em serviços de acolhimento

Hoje eu compartilho um material diferente, é uma proposta para auxiliar o processo de atendimento  com as famílias nos serviços de acolhimento institucional. Tive a felicidade de conhecer a autora da cartilha, Hivana Fonseca no II Seminário de Psicologia e Assistência Social realizado pelo Conselho Regional de Psicologia do Rio de Janeiro, a qual disponibilizou a cartilha para divulgação. A cartilha foi elaborada pela psicóloga Hivana Raelcia Rosa da Fonseca com orientação da Profª Drª Sílvia Helena Koller Essa cartilha foi idealizada durante meu mestrado quando trabalhei com famílias de crianças e adolescentes em serviços de acolhimento. Observei que, mesmo com baixa ou nenhuma escolaridade, ter informações por escrito era um fator organizativo no processo de acolhimento. Esta cartilha tem o objetivo de auxiliar as famílias com crianças e adolescentes em serviços de acolhimento a organizarem e entenderem o processo de acolhimento. Foi formulada com base na legislação, normas técnicas e estudos relacionados aos serviços de organizada em perguntas e respostas. A cartilha oferece espaço para anotações dos serviços de referência que poderão dar apoio às famílias durante e depois do acolhimento. BAIXAR: CARTILHA DA FAMÍLIA – VERSÃO WEB (1) CARTILHA DA FAMÍLIA – VERSÃO GRÁFICA (1) Parabéns e obrigada pela contribuição, Hivana! Tenho certeza que este material servirá de inspiração para atuação com as famílias em outros serviços da Proteção Social no SUAS.