O desafio do trabalho coletivo no SUAS

Por Lívia Soares de Paula e Tatiana Borges[1] Psicóloga do CREAS de Itaúna/MG e Assistente social na regional Franca do estado de SP No último texto de 2017, publicado em novembro aqui no Blog, propusemos uma discussão acerca dos desafios que se apresentam nas relações entre CRAS e CREAS. Muitas foram as manifestações dos colegas do SUAS a respeito da importância de discutirmos este assunto e das dificuldades para que esta discussão aconteça de forma efetiva e produtiva. Sendo assim, optamos por tentar avançar um pouco nas reflexões sobre esta temática. Considerando que a colega colaboradora Tatiana Borges também abordou este assunto em um de seus textos[2], surgiu o desejo de estabelecermos uma parceria na escrita desta colaboração. Esperamos que, em meio a tantas ameaças que as políticas públicas têm sofrido, nossas pontuações possam contribuir para renovar as energias daqueles que, assim como nós, continuam acreditando na potência da atuação no Sistema Único de Assistência Social. Dentre muitas das manifestações a respeito do texto anterior, alguns profissionais expuseram sua insatisfação diante do acúmulo de trabalho em seu cotidiano. Vemos que este é um tema recorrente no âmbito dos técnicos do SUAS. E é exatamente por isso que nos interessa lançar a nós mesmos algumas perguntas: o que tem nos acumulado? Como temos olhado para este excesso de tarefas? O que nos é possível fazer diante do cenário que está desenhado em nosso equipamento neste momento? Pode ser que nas respostas a tais perguntas, apareçam os inúmeros problemas que temos: desvalorização da política; a velha lógica assistencialista; falta de interesse e conhecimento de quem gere nossos serviços; demandas que não são nossas; demandas que são nossas, mas que escancaram nossa impotência, entre outras coisas. Diante destes problemas, a angústia é tão grande que às vezes nos cega e produz desesperança. Nos sentimos sozinhas/os e desamparadas/os. Essa sensação não é injustificada. Ainda esperamos por soluções individuais, tanto para nós, profissionais, quanto para as/os as/nossos usuárias/os. Ainda trabalhamos no caso a caso, no um a um. Falamos sobre coletividade, mas parece que ainda não sabemos o que isso significa. E quando nos aproximamos de qualquer iniciativa que remeta a ela, nos assustamos. A ideia de coletividade nos convoca a aprender a estar com. Existirá exercício mais desafiador que este? Se começar a refletir sobre a coletividade já nos causa inquietação, imagina só a proposta de realização de um trabalho coletivo com famílias e indivíduos no território em uma ótica emancipatória? Pois bem, esta é a intencionalidade presente na política de assistência social e se isto causa medo, podemos dizer que estamos juntas/os. Mas não juntas/os apenas no reconhecimento de que nosso excesso de serviço nos impede até de dialogar com nossos pares, queremos estar juntas/os para refletir sobre isso e, ao mesmo tempo, atuar numa perspectiva modificadora da sociedade. Afirmamos que se trata de uma perspectiva modificadora porque temos clara a realidade individualista em que vivemos, na qual bens universais e coletivos não são valorizados e a indiferença com o que se imagina não dizer respeito a “si próprio” impera. Sabemos que trabalhar na linha de frente de uma política pública e desenvolver um trabalho social exige conhecimento teórico-metodológico, competência técnica-operativa e, principalmente, coragem para mudar, encarar o medo e enfrentar o grande desafio que é nadar contra correnteza. Em uma sociedade individualista, onde cada cidadão é visto como “culpado” pela sua condição social, independente de sua classe, gênero ou etnia, onde cada pessoa, individualmente, é responsável por cuidar da própria vida, estando ou não desprotegida, estando ou não vulnerável, estando ou não exposta às mais variadas formas de risco social, observamos que as políticas públicas não são fortalecidas. O não fortalecimento das políticas públicas, em nosso entendimento, aponta para o desafio que estão sujeitos todos aqueles envolvidos no planejamento, gestão e execução dos serviços advindos de tais políticas. Toda pessoa que trabalha em determinada política assume um compromisso social de extrema relevância. É este compromisso ético-político que, muitas vezes, nos convoca a refletir sobre nossa atuação e a repensar o modo como trabalhamos. Compreendemos que não é fácil mudar hábitos e pensamentos, não é fácil mudar a rotina de trabalho e nos organizarmos em equipes com objetivos comuns, dialogando e compartilhando saberes, mas as experiências de pessoas que ousaram nadar contra a maré podem nos ser fonte de inspiração e admiração, por nos apresentarem o novo e serem bastante produtivas. Sabemos que não é nada simples primar pela construção de um trabalho coletivo, mas cremos que é consenso de boa parte de nossos colegas do SUAS que o trabalho isolado e personalizado que, infelizmente, ainda executamos em nossos serviços, revela-se fonte de grande angústia e até de adoecimento, além de não apresentar, na maioria das vezes, os resultados que esperamos. Esta constatação não despreza a importância das nossas ações em cada situação que acompanhamos, mas será que não podemos avançar? Cremos que, em algum momento, é preciso haver a transição do individual para o coletivo, pois, nem mesmo uma equipe de referência completa e multidisciplinar dará conta do atendimento de todas as solicitações no trato “um a um”. As premissas do SUAS exigem de nós, profissionais e gestores/as, um esforço a mais e isto não quer dizer que estamos fechando os olhos para as inúmeras dificuldades que enfrentamos, nem para as situações restritivas e negativas do trabalho em equipe, interdisciplinar e coletivo. Mas o fato é que só se garante ou conquista direitos sociais na coletividade e a História confirma esta assertiva. Assim, atuar como profissionais de referência em uma política pública já nos coloca contra a maré e assumir a incumbência de realizar um trabalho coletivo é, de fato, nadar contra a correnteza, o que não se configura como algo simples.  No entanto, sabemos que o lugar que as águas nos levam é o que mantém as coisas como estão, podendo retroceder cada vez mais. O inconformismo com a realidade à nossa volta nos impulsiona a assumir o desafio de tentar chegar à fonte. A maré é o acúmulo de trabalho

Precisamos falar sobre a cesta básica

Por Tatiana Roberta Borges Martins[1] A cesta básica de alimentos é uma velha conhecida da política de assistência social, ela existe desde as primeiras formas de prestação de auxílio à população e observo que, pelo menos entre as/os assistentes sociais, existe uma relação espinhosa com esta provisão, talvez pelo reducionismo do senso comum, que classifica a avaliação socioeconômica para concessão de benefícios como a única atribuição desta profissão, mas, sobretudo, pelo viés de caridade e moeda de troca que a cesta básica carrega ao longo da história e que a política de assistência social procura romper ao pautar benefícios socioassistenciais como direito de quem necessita. Não pretendo problematizar neste espaço sobre qual trabalhador/a do Sistema Único de Assistência Social/SUAS deve conceder a cesta básica para o cidadão, deixo esta tarefa para a Rozana Fonseca (risos), a intenção é realizar uma reflexão de como todos nós, que atuamos nesta política pública, nos relacionamos com esta forma de oferta que, segundo os dados oficiais[i], é a maior concessão referenciada como benefício eventual na assistência social. Além disso, sabendo que, em nossa sociedade, a doação de alimentos ainda se configura como uma prática ligada à religiosidade dos “cidadãos de bem” que tem o dever de praticar esmolas para ficarem em paz com suas consciências, proponho uma breve, mas indispensável análise, de como o poder público trata a questão da oferta de alimentação: também como um favor ou como um direito humano fundamental e universal?[ii] Recentemente, no espaço de educação permanente da região[iii] em que atuo, tivemos a presença da brilhante pesquisadora da temática “benefícios eventuais”, Drª. Gisele Bovolenta, que trouxe a tona antigas inquietações acerca do tema e as provocações que efetuo aqui são baseadas em seus textos, os quais recomendo a todas/os trabalhadoras/es da área conhecê-los. Os benefícios eventuais na assistência social A Política Nacional de Assistência Social/PNAS quando define que sua principal função é a proteção social está incluindo a integração de serviços e benefícios socioassistencias, o que engloba o benefício eventual como parte das seguranças sociais, mais especificamente a segurança de sobrevivência/renda. No entanto, é evidente que os avanços obtidos no SUAS não abrangeram, de forma significativa, os benefícios eventuais. Gisele Bovolenta (2017) afirma que os benefícios eventuais estão nominados na Lei Orgânica de Assistência Social/LOAS, mas ainda não foram conceituados, ou seja, não existem muitos estudos e nem muitos indicativos de quais os tipos e espécies de benefícios de vulnerabilidade temporária devem ser ofertados pela assistência social, se estes benefícios devem ou não ser pagos em pecúnia, ou qual o local apropriado para a entrega, tampouco há precisão sobre as formas de gestão, regulamentação e financiamento destas provisões. A pouca atenção dos municípios com esta parte da proteção social e principalmente a negligência da maioria dos estados contribuem para a manutenção da visão das pessoas que solicitam estes benefícios como carentes, desvalidas, coitadas, folgadas, acomodadas, entre outros termos pejorativos que se distanciam da noção de cidadãos de direitos. A ausência de regulamentação posterior a LOAS e demais normativas nacionais levou a uma operacionalização desorganizada dos benefícios eventuais, mais identificada com ações sociais isoladas de caráter assistencialista e clientelista do que com uma política pública cuja centralidade é o Estado (união, estado e município). Dito em outras palavras, a falta de interesse em regulamentar os benefícios eventuais e aproximá-los do campo de direitos juridicamente reclamáveis (como o BPC) tem a ver com as vantagens obtidas nas ações paternalistas e eleitoreiras. “A cesta básica é a água com açúcar na assistência social” Ouvi esta frase da Profª. Aldaísa Sposati em um espaço de formação que participei e imediatamente concordei e até me lembrei de momentos que, inconscientemente, também utilizei este “chazinho” nos atendimentos do famigerado “plantão social”. Ou seja, a afirmação é que a cesta básica é usada como um “calmante” quando não sabemos como lidar com as situações que emergem no cotidiano da prática profissional no SUAS, mas queremos amenizar de alguma forma o sofrimento do cidadão. Assim, a resposta do poder público para diferentes demandas é sempre a mesma: provisão de alimentos, isso quando há resposta, o que acaba por maquiar as reais desproteções sociais e violações de direitos existentes. Como a demanda se apresenta, por vezes, complexa, a concessão de cesta básica parece aliviar e confortar as adversidades vividas. Como o Estado se propõe a ser mínimo para a área social, prover alimentação, enquanto indispensável para a sobrevivência humana, parece ser o lenitivo necessário para que o indivíduo supere por si só a situação vivenciada. Por vezes, o que se observa é uma provisão pontual, isto é, o cidadão não é acompanhado ou mesmo encaminhado em suas necessidades aos serviços socioassistenciais complementares e necessários. (BOVOLENTA, 2017, p.509) Diante desta reflexão, é incoerente a reclamação de que os usuários só aparecem na assistência social atrás de cestas básicas, mesmo isso sendo um fato, porque se analisarmos bem, a mínima presença do Estado na vida de grande parte dos pobres historicamente foi esta: provisão de alimentos, sem demais serviços integrados. Já ouvi histórias de sorteios de cestas básicas para que os usuários participem de reuniões e depois querem reclamar quando eles aparecem no CRAS pedindo alimentos? Penso que temos que adotar um olhar crítico sobre as ofertas de serviços e benefícios públicos, antes de afirmarmos que os usuários não aderem às ações. E o poder público aderiu aos serviços, programas e benefícios de assistência social? E nós profissionais, de fato aderimos ao modelo do sistema proposto? Cesta Básica é mesmo um benefício eventual? Outro ponto importante e que nos faz pensar é se uma necessidade contínua de uma família à alimentação pode ser considerada eventual, baseada no conceito de vulnerabilidade temporária ou pontual. Acredito que não. Pois, se afirmamos, com tanta convicção, que são as mesmas famílias que sempre solicitam a cesta básica na prefeitura, não se trata de uma vulnerabilidade passageira, mas sim de vulnerabilidade social ou de situação de pobreza que é reflexo do contexto social, econômico, político e cultural do país e que não se resolve rapidamente,

“Cadê o pessoal dos direitos humanos? ” Está no SUAS!

Por Tatiana Borges* Nestes tempos em que o óbvio precisa ser dito, tenho sentido a necessidade de provocar uma reflexão sobre os direitos humanos e a política de assistência social, sem, é claro, qualquer pretensão de esgotar um tema de tamanha complexidade e que na realidade nem me parece tão óbvio assim. O fato é que muito se tem dito de direitos humanos, no senso comum, na parcela retrógada da sociedade e nas redes sociais o termo aparece de forma pejorativa, carregado de distorções, mas e em nosso meio, entre nós profissionais das áreas humanas, técnicas/os do Sistema Único de Assistência Social – SUAS, como estas questões têm sido difundidas? Trabalhamos com uma política que visa garantir direitos e como falamos de direitos para os nossos usuários e usuárias? Direitos sociais e civis estão descolados dos direitos humanos? Vislumbramos a assistência social como direito? Estamos mesmo falando em direitos? Este texto é um convite para pensarmos nestas indagações e começo deixando claro que, a meu ver, o nosso lugar de fala não nos permite a acomodação do senso comum, tampouco a repetição das falácias que têm sido ressaltadas por aí como, por exemplo: “direitos humanos para humanos direitos”, “direitos humanos só serve para bandidos”…, mas, por que não podemos reproduzir o que todos falam? Primeiro por que falar em direitos humanos na contemporaneidade significa falar em direito de ser pessoa, de se constituir como gente, sem desassociar uma classe de pessoas de outra classe, como se uma classe de pessoas fosse ‘do bem’ e considerada portadora de direitos e a outra classe, ‘a do mal’, não tivesse dignidade. Desta forma, toda pessoa, por ser humana, deve contar com os direitos humanos, que na verdade são um conjunto de direitos. Nas palavras de Hanna Arendt “temos direito a ter direitos” e isso nos remete aos princípios da igualdade e equidade e ao pressuposto constitucional de que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza” (art. 5º). Segundo por que não existe divergência entre a defesa dos direitos humanos e o combate à criminalidade, muito pelo contrário, é justamente por se incomodar com a criminalidade que se defendem direitos, dentre eles o da segurança pública. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (art. 3º) diz que: “Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal”, veja só os direitos humanos se associa à segurança, portanto não são coisas destoantes.  A despeito da imensa literatura sobre direitos, o texto de Ramon Kayo “Ninguém é a favor de bandidos, é você que não entendeu nada” aborda esta questão da infeliz associação de direitos humanos com ‘defesa de bandido’ de uma forma bem didática, recomendo a leitura e destaco o trecho que evidencia que não é infringindo os direitos humanos que se diminui o número de marginais: “É confuso que o cidadão que clama tanto por justiça, que a lei seja cumprida, fique ávido para descumpri-la: tortura, homicídio e ameaça são crimes, mesmo que sejam contra um condenado. Então, não, bandido não tem que morrer, porque isso te tornaria tão marginal quanto (…) ninguém quer que os bandidos sejam especiais: o que o ‘povinho dos Direitos Humano’ quer é que a sociedade não crie mais marginais e que a quantidade dos existentes diminua” Assim, é por acreditar que a negação de direitos básicos traz consequências que afetam a vida de todas as pessoas e por saber que o modo como nos relacionamos em sociedade possui raízes na estrutura social, econômica, política e cultural do país e do mundo que se defendem direitos, individuais e coletivos, a todos e a quem deles necessitar.  Efetivamente, não pretendo aprofundar neste espaço o debate sobre criminalidade, mas considero imprescindível conectar as demandas de nosso trabalho no SUAS, sobretudo as demandas dos usuários que atendemos, à realidade social mais ampla e esta realidade inclui o debate sobre os direitos humanos, direitos estes construídos historicamente com a influência internacional e que são entendidos como uma unidade indivisível, interdependente, inter-relacionada e de alcance universal.  Os direitos humanos no SUAS Além do fato da assistência social ter como uma de suas funções a defesa e garantia dos direitos, a afirmação que nós, trabalhadoras/es do SUAS, somos ou deveríamos ser defensoras/es de direitos humanos faz sentido se atentarmos para a própria Política Nacional de Assistência Social – PNAS 2004 que coloca o SUAS como um dos sistemas que defende e promove direitos humanos: “São princípios organizativos do SUAS: articulação interinstitucional entre competências e ações com os demais sistemas de defesa de direitos humanos, em específico com aqueles de defesa de direitos de crianças, adolescentes, idosos, pessoas com deficiência, mulheres, negros e outras minorias; de proteção às vítimas de exploração e violência; e a adolescentes ameaçados de morte; de promoção do direito de convivência familiar; ” (p 88). “A atenção às famílias tem por perspectiva fazer avançar o caráter preventivo de proteção social, de modo a fortalecer laços e vínculos sociais de pertencimento entre seus membros e indivíduos, para que suas capacidades e qualidade de vida levem à concretização de direitos humanos e sociais” (p 90).  Na NOB SUAS 2012 também aparece a defesa da dignidade da pessoa humana, como princípio ético para a oferta da proteção socioassistencial no SUAS. Defender a dignidade da pessoa humana é defender direitos humanos, o que inclui a defesa incondicional da liberdade, da privacidade, da cidadania, da integridade física, moral e psicológica. (Art. 6º). Ao analisar as categorias profissionais que compõem o SUAS a ligação com os direitos humanos é revelada em praticamente todos os códigos de ética que disciplinam as áreas de saber integrantes deste sistema: Assistente Social: “Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do autoritarismo”. (Princípios Fundamentais). Psicóloga/o: “O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos. ” (Princípios Fundamentais). Advogada/o: “O advogado, indispensável à administração da Justiça, é defensor do Estado Democrático de Direito, dos

Quem fiscaliza os serviços e benefícios da Assistência Social?

Por Tatiana Borges* Como assistente social e servidora do estado é comum, em alguns momentos no trabalho cotidiano do SUAS, sermos confundidas com fiscais da política de assistência social dos municípios. Para além da fiscalização, observo por diversas vezes que gestoras/es e trabalhadoras/es municipais esperam do ente estatal uma ação mais incisiva que possa solucionar as inadequações existentes nas equipes de referência, nas estruturas físicas e formas de organização dos serviços e benefícios socioassistenciais, como também nas próprias gestões de assistência social. Considero que este anseio é próprio de quem quer ver o Sistema Único de Assistência Social que tanto estudamos nas orientações técnicas, textos e legislações, materializado na realidade de trabalho vivida. Penso ainda que esta aspiração parte de quem busca e acredita ser possível que o SUAS, tal como proposto, atue na proteção a vida, na prevenção da incidência de riscos sociais, na identificação e superação de desproteções sociais e na redução de danos impactando a existência de grupos de pessoas. Eu também acredito nesta possibilidade do SUAS viabilizar direitos socioassistenciais. No entanto, aprendi nos espaços de formação de assistentes sociais a evitar pensamentos mágicos e a desvincular do messianismo presente na profissão e que obviamente influencia a política de assistência social. Este messianismo é a ideia de que “boas moças” salvam as pessoas, resolvem os problemas da pobreza na sociedade e promove as mudanças sociais. Não obstante, a desassociação do fatalismo histórico onde a realidade já estaria definida levando a acomodação e mediocridade profissional também sempre se fez urgente. (IAMAMOTO, 2005) Trago este debate profissional por que de alguma forma a história da política de assistência social e da profissão de serviço social se misturam, ambas nasceram da necessidade do Estado controlar e fiscalizar os pobres para manter a ‘ordem social’. No serviço social houve o momento de ruptura com o modelo conservador conhecido como movimento de reconceituação da profissão. Na política de assistência social, a ruptura é a constituição, é a LOAS e o SUAS que coloca em foco o rompimento com velhas práticas assistencialistas, clientelistas e descontínuas para se trabalhar com a noção de direitos que podem ser reclamáveis, com serviços continuados, gratuitos e qualificados e também com o controle social das ações. Neste contexto de rupturas não seria demais afirmar que não há facilidades e não existe mágica, embora possamos sim construir este novo caminho de efetivação da política conforme previsto nas normativas e é exatamente o que tem sido feito pelos conjuntos diversos de atores/as sociais que lutam cotidianamente em seus espaços ocupacionais e de participação para que o SUAS se torne uma realidade. E para que estas novas possibilidades aconteçam de fato é preciso ter noção de totalidade e perceber o movimento dialético da sociedade, além dos diferentes projetos societários que disputam forças e envolvem os espaços públicos em cada esfera de governo. E por falar em esferas de governo o que pretendo ressaltar neste texto é o fato de NÃO existir na Constituição Federal e legislações do SUAS uma hierarquia entre os entes federados (estado, município e união) mas sim corresponsabilidades. Valeria um estudo mais aprofundado da relação entre estados e municípios no âmbito da assistência social para entendermos como se estabeleceu esta suposta hierarquia. Em minhas pesquisas encontrei duas publicações específicas do estado de São Paulo que evidenciam a prioridade histórica do repasse de auxílios e subvenções estaduais diretamente às entidades privadas sem critérios claramente estabelecidos e com a intervenção do poder legislativo. Esta prática ainda é existente e conhecida como indicações parlamentares, que não passam pelo crivo dos conselhos de assistência social. Segundo BOVOLENTA (2016) este tipo de ação “produziu uma relação de subalternidade entre os entes, uma vez que criava uma hierarquia entre estados e municípios”. Assim, não existe na lei, mas esta visão de hierarquia criada equivocada e historicamente ainda permeia a relação estado-municípios e a meu ver prejudica o avanço da política de assistência social, pois além de criar expectativas irreais, faz com que algumas realidades sejam distorcidas e por vezes até omitidas pelo receio de repreensões, punições e/ou perda de recursos. Efetivamente, as fragilidades e lacunas das ofertas socioassistenciais devem ser conhecidas e analisadas criticamente em uma relação de horizontalidade e confiança entre os entes federados para que seja possível a união de esforços no alcance da superação, primando sempre pela qualidade do atendimento à população usuária desta política pública. É preciso estar claro que o conceito atual da gestão no SUAS tem se distanciado do caráter hierárquico e centralizador e assumido um papel de: cooperação; de apoio técnico na organização, implantação e reordenamento dos serviços; de educação permanente; supervisão; acompanhamento; diagnóstico; informação; vigilância; monitoramento analítico por dados e indicadores e avaliação. Aspectos que orientam o planejamento estratégico da política pública de assistência social, com intuito de aprimorar a gestão, fortalecer o controle social e principalmente qualificar os serviços, programas, projetos e benefícios de assistência social. Dito isso seria a fiscalização a função principal do ente estadual? Se atentarmos para os textos da LOAS (art. 13) e da NOB SUAS 2012 (art. 12 e 15) que dispõem sobre as atribuições dos entes estatais não encontraremos esta função como sendo a principal dos estados, mas sim dos conselhos municipais de assistência social, devido ao seu caráter deliberativo. O que não quer dizer que não exista ou deva existir apuração de denúncias e/ou fiscalizações quanto à utilização de recursos estaduais na finalidade prevista, por exemplo. Mas não é esta a essência da gestão estadual da política de assistência social. Para esta atividade existem órgãos específicos como tribunais de contas, controladorias gerais, entre outros, além do Ministério Público que deve apurar as irregularidades e tomar as medidas cabíveis. Segundo as orientações às práticas de supervisão do estado de São Paulo (2016): O papel preponderante do estado é monitorar e avaliar territorialmente a gestão socioassistencial das diferentes regiões, acompanhando a gestão municipal e os resultados de suas ações, dando apoio e assessoria técnica de forma sistemática, visando o efetivo cumprimento das normativas e buscando excelência no atendimento à

Estamos nos organizando em caixinhas e desorganizando as proteções ou nos organizando em proteções e desorganizando as caixinhas?

Por Tatiana Borges* “Comecei a pensar, que eu me organizando, posso desorganizar, que eu desorganizando, posso me organizar” Foi com esta frase de Chico Science e Nação Zumbi que terminei o texto de minha primeira participação aqui no Blog (Encontros e trocas profissionais: relato de uma experiência exitosa) e volto neste mesmo espaço com a inquietante reflexão do quanto que nós, profissionais do SUAS, temos que trabalhar na construção e desconstrução de práticas e posturas no dia a dia desta política, pois os nossos processos de trabalho se dão nos encontros, nas trocas e alianças que estabelecemos, seja com usuárias/os, com nossas/os colegas da mesma ou de outras categorias ou com nossas/os superiores nas estruturas institucionais. Justamente na reprodução das relações sociais é que vamos nos desorganizando e nos organizando enquanto atoras/es importantes de uma política pública, assim como o próprio SUAS que, para se organizar como sistema teve e tem que desorganizar e romper a cada dia com as formas tradicionais de se fazer a assistência social, formas estas incompatíveis com o processo democrático, com a igualdade e com a dignidade humana. Alguns anos de experiência na assistência social me evidenciaram a tendência natural que temos de nos organizarmos em caixinhas, ou seria desorganizarmos? Não sei. O que é possível observar é que esta característica para além de dar uma sensação de uma habitual zona de conforto, limita a prática profissional, a interdisciplinaridade, o trabalho coletivo e prejudica o conteúdo e o alcance dos serviços, programas, projetos, benefícios e transferência de renda no âmbito do SUAS. (Assunto muito bem tratado no último texto da Aline Moraes) As armadilhas das caixinhas possuem variadas formas e a maioria delas são bem conhecidas pelas/os trabalhadoras/es do SUAS, um exemplo é o aprisionamento por categorias de nível superior, onde é defendido atribuições exclusivas como: “visita domiciliar deve ser feita por assistente social” “é o psicólogo que tem habilidades para grupos” estas são algumas frases que costumamos a ouvir. Este tema já vem sendo tratado neste blog e, diga-se de passagem, com muita didática pela Rosana Fonseca, mas reforço que este pensamento em caixinha não prima pela partilha e nem pela produção de novos conhecimentos, tampouco prioriza as seguranças que a política deve garantir, mas sim a segurança de espaços profissionais e de vaga de trabalho que somados ao processo de alienação da divisão entre os que pensam e os que executam as ações, configuram-se em um dos inúmeros efeitos das contradições das relações de trabalho, que não pretendemos aprofundar aqui. (TORRES, 2014; RIZZOTTI, 2014) A compartimentalização a qual me refiro é ainda mais automática quando falamos em setores, áreas, unidades, núcleos, divisões administrativas, entre outros.  No entanto, a provocação que trago é que o balizamento que estamos criando entre as proteções hierarquicamente definidas como básica e especial de média e alta complexidade pode também estar limitando a função central da política de assistência social que é a própria proteção social dos indivíduos e famílias e que para nós gestoras/es e trabalhadoras/es é, ou deveria ser, o objetivo em comum, pressupondo horizontalização e democratização de poderes e saberes. Ora, é sabido que as demandas e violações apresentadas pela população usuária dos serviços públicos de uma forma geral não serão respondidas unicamente por uma política pública, ou por um tipo de proteção, tampouco por um tipo exclusivo de trabalho técnico, ademais, “a proteção integral requer complementariedades na intervenção dos profissionais de diferentes serviços”, na assistência social, esta complementariedade se dá entre os serviços abrangidos pelas proteções sociais, a básica e a especial. (TORRES, 2014) Com certo tempo realizando o acompanhamento da política de assistência social nos municípios foi possível observar a grande necessidade que temos de identificar o que diferencia as proteções, muitas vezes na ânsia maior por demarcar espaços de atuação, uma frase comum que destaca bem esta afirmação é “se tem violação de direitos a proteção social especial de média complexidade que deve atender”, no entanto quando temos que ajuntar ações surge enormes dificuldades, como por exemplo, no reordenamento dos serviços de convivência e fortalecimentos de vínculos, na ocasião que foram criadas metas de atendimentos para as situações prioritárias que se configuram como proteção social especial, mas que devem ser atendidas no serviço da básica e que até hoje geram inúmeras dúvidas entre técnicas/os e gestoras/es, este processo daria assunto para vários outros posts. O que pretendo ressaltar aqui é que temos propensão em usar o que diferencia para limitar ou encaixotar e não para alargar, ou no caso, ampliar a proteção social.  (TORRES e FERREIRA, 2016) Esta problematização tem sido realizada nos encontros ampliados do GECCATS (Grupo de Estudo e Capacitação Continuada das/os Trabalhadoras/es do SUAS) que mantemos na região de Franca/SP. Ao longo de 2016 debatemos os anseios relativos ao referenciamento e contrarreferenciamento entre CRAS e CREAS na perspectiva de superar a fragmentação e construir caminhos por intervenções conjuntas e partilhadas, sem desrespeitar as autonomias intelectuais. Abro aqui um parêntese para explicar que o GECCATS surgiu como uma iniciativa de um grupo de profissionais do estado, dos CRAS e órgãos gestores e se constituiu em um espaço de estudo e trocas de experiências para trabalhadoras/es de nível superior da proteção social básica, pois naquele momento (2009) o entendimento do papel do CRAS como porta de entrada do SUAS era premente. A complexidade das temáticas associadas à proteção social especial sempre foram tratadas em espaços separados deste grupo. Há algum tempo tem surgido fortemente a necessidade em transformar o GECCATS em um grupo de interproteções, com a expansão da participação para trabalhadoras/es da PSE de CREAS e órgãos gestores. A presença das queridas professoras Abigail Silvestre Torres e Stela da Silva Ferreira em um dos encontros reforçaram este caminho inadiável de aprimoramento e amadurecimento do grupo ao debater com as/os participantes as questões que suscito neste post e que nos inquietam e em certo ponto até nos assustam por nos tirar da caixinha. Assim todo o conteúdo deste texto tem como pano de fundo os meus registros e interpretações das colocações

O primeiro-damismo e a desprofissionalização como barreiras na consolidação do SUAS

Por  Tatiana Borges; Aline Morais; Lívia de Paula; Rozana Fonseca e Thaís Gomes Apesar de estar reconhecida enquanto política pública na Constituição Federal de 1988, a Assistência Social tardiamente passou a se constituir como direito social e dever do Estado, já que o seu histórico é fortemente marcado pela caridade, filantropia e voluntariado, ou melhor, é o histórico do ‘não direito’, do favor. É possível afirmar que foi com a implantação do SUAS, através da PNAS de 2004, que ocorreu um salto na profissionalização da assistência social, ou seja, contrapondo as práticas emergenciais de compaixão, de improviso e personalismos,  é o arcabouço normativo dos últimos 10 anos da política de assistência social que reforça ou exige a presença de equipes de referência interdisciplinares constituídas por servidores públicos para a intervenção no conjunto de expressões das desigualdades sociais, através de serviços e benefícios socioassistenciais. Dito de outra forma, o reconhecimento, através de ordenamentos institucionais e direcionamentos políticos, de que o atendimento com dignidade prestado à população exige condições de trabalho e profissionais qualificados nas dimensões teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa é recente. Assim como é novo o tratamento da Assistência Social como responsabilidade estatal, expressada através de seguranças indispensáveis ao desenvolvimento pleno dos cidadãos com a garantia de direitos e com o envolvimento efetivo de todas as esferas de governo. Muito embora este entendimento seja fruto de estudos muito anteriores ao SUAS, de embates e lutas históricas para o reconhecimento da política de Assistência Social como direito e de militância política de diversos segmentos da sociedade, bem como de profissionais, com destaque aos assistentes sociais, o movimento para a implantação deste sistema é ainda incipiente, pois temos mais um modelo do que um sistema propriamente instalado, o que não invalida, de forma alguma, os avanços reais conquistados. Avanços oriundos especialmente dos movimentos organizados de trabalhadoras/es e de usuários, seja na militância diária em seus equipamentos de trabalho ou em fóruns, grupos e conselhos destinados à discussões, deliberações e construções da política. O avanço do SUAS – mesmo que não esteja nivelado, pois a cobertura para os riscos sociais não é universalizada e há um descompasso entre as formas e o tempo histórico de incorporação desta política pela união, estados e municípios – é inegável, principalmente, pelo potencial, já demonstrado pelas pesquisas e pelos indicadores existentes, de impactar a existência de grupos de pessoas, atuando na proteção a vida, na prevenção da incidência de riscos sociais, na identificação e superação de desproteções sociais e na redução de danos. Ainda assim, o desafio cotidiano que nós, das diversas categorias profissionais – que hoje, graças ao conjunto normativo do SUAS, compõem a política de assistência social – enfrentamos é superar a tradição de práticas assistencialistas pautadas sempre pelo controle e adestramento das famílias e pela criminalização da pobreza como forma de manter “a ordem e o progresso” do país, bem como o poder sobre os pobres, tratando os como desvalidos, carentes e não como cidadãos ativos de direitos. Considerando que o primeiro-damismo é uma realidade em muitos municípios, fica mais evidente a necessidade de pautarmos criticamente este cenário, uma vez que agora há uma representação emblemática e carregada de retrocessos. O quanto o primeiro-damismo tem emperrado a consolidação no SUAS? Valeria um estudo, porque sabemos que ainda há uma distância entre a legislação e o modo como a Assistência Social é vista pela população, pelos seus dirigentes e gestores municipais. O que sabemos é que, em muitos municípios a realidade da política de assistência social é permeada por ações de cunho clientelista que se convertem em moeda de troca nos acordos político-partidários entre prefeitos e vereadores para garantir votos da população. A incidência destas práticas na política de assistência social culmina numa desarticulação e fragmentação da mesma, numa sobreposição de propostas, sem considerar o que já existe no SUAS, reduzindo as ações à ajudas e concessões pontuais da primeira-dama. Nós, profissionais que compomos o SUAS e que defendemos este modelo de política pública, trabalhamos em uma direção que tem o Estado como principal responsável pelo bem-estar social e assim tendo como competência a promoção da proteção social que, no âmbito do SUAS, se materializa por meio dos serviços e benefícios socioassistenciais. Nesta direção o Estado atua como agente executivo (PAIF e PAEFI, programas e benefícios), agente regulador (dos serviços socioassistenciais prestados por entidades e organizações sociais) e agente de defesa de direitos e da participação social e esta direção, que preza a assistência como um direito e não como uma benesse, nos faz posicionarmos contrárias/os às propostas que venham reforçar o primeiro-damismo, estatuto que representa tudo aquilo que procuramos romper, ou seja, com o clientelismo, com o cerceamento de famílias e com o  uso das pessoas que necessitam da assistência social para a promoção da imagem do político. O primeiro-damismo, a nosso ver, é a caricatura da negação do direito, uma vez que simboliza, de forma bastante clara, o lugar que governos baseados em assistencialismo reservam à população usuária do SUAS:  o lugar de quem deve agradecer ao político pela sua bondade, por sua benevolência. Por saber que nós, trabalhadoras/es do SUAS, nos constituímos como a “tecnologia básica” deste sistema, uma vez que “a mediação principal é o próprio profissional” (BRASIL, 2008), não podemos nos calar, pois o trabalho social que realizamos exige conhecimento, formação técnica e perfil e não é possível que para um cargo de condução de uma política pública o critério seja o casamento e não o currículo profissional ou concurso público. A qualificação do trabalho social com famílias é um grande marco na implantação do SUAS e em uma de suas dimensões há um conjunto de atribuições técnicas/os, que compõem as equipes de referência dos serviço socioassistenciais. Entre estas atribuições está o acompanhamento às famílias que se encontram em situação de vulnerabilidade e/ou risco social decorrente, dentre outros fatores, da precariedade de renda. Assim, as famílias beneficiárias de programas de transferência de renda são prioritárias para o acompanhamento social que se configura como a oferta de um serviço e não uma exigência ou

Encontros e trocas profissionais: relato de uma experiência exitosa

Hoje é dia de dar as boas-vindas a mais uma colaboradora do Blog Psicologia no SUAS, Tatiana Borges*, representando os profissionais do Serviço Social. Presença que só me faz continuar acreditando na potência dos encontros! Gratidão pela sua presença, Tatiana! <3 Por Tatiana Borges Espaços privilegiados de reflexão da prática profissional, como o Blog de Psicologia do SUAS tem, entre tantas coisas, o poder de aproximar pessoas e foi justamente o que ocorreu com a autora e nós, assistentes sociais que trabalhamos pelo estado de São Paulo na regional de Franca que abrange 23 municípios. Há algum tempo acompanho as publicações e a familiaridade das análises, discussões e indicações contidas no Blog com as nossas atuações e construções no âmbito do SUAS é imensa. Destaco de uma forma especial o comprometimento profissional e pessoal da Rozana Fonseca com a efetivação da Política de Assistência Social que me chamou atenção desde o início, principalmente em suas participações em nossos momentos de trocas e diálogos no GECCATS (Grupo de Estudo e Capacitação Continuada das/os Trabalhadoras/es do SUAS) que, assim como o Blog, acaba dando vazão a tantas descobertas e angústias que emergem do cotidiano do trabalho técnico desta Política. Proporcional à minha admiração pelo Blog e Rozana é a honra e responsabilidade de contribuir, em alguns momentos, com este espaço representando a categoria da qual me orgulho em fazer parte, sobretudo pela imensa contribuição para o SUAS destas/es profissionais: as/os assistentes sociais. Fundamentadas pelo Código de Ética, que traz como princípio “o compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e com o aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência profissional”, nós, assistentes sociais, somos instigadas a ir além das rotinas institucionais para buscar apreender no movimento da realidade possibilidades presentes, transformando-as em projetos e propostas profissionais. (Marilda Iamamoto, 2016). É com esta escolha teórica que foi gestado o GECCATS, em um momento ainda bastante incipiente da institucionalização do SUAS no país, quando se buscava construir caminhos para a implantação efetiva dos CRAS numa região composta predominantemente por municípios de pequeno porte, onde a sensação de isolamento profissional é presente e os processos de capacitação são escassos. Uma das grandes motivações para a criação deste grupo de educação permanente foi à necessidade de nossa aproximação, enquanto técnicas da DRADS (Diretoria Regional de Assistência e Desenvolvimento Social) com as/os técnicas/os dos municípios, em um contexto de mudança indispensável de uma relação verticalizada para uma construção coletiva e horizontal, respeitando as atribuições institucionais de cada ente. O objetivo do GECCATS, desde a sua formação é propiciar um espaço de trocas de experiências, estudo e reflexão acerca das legislações e documentos de orientação, além de palestras informativas sobre a política de assistência social. Os encontros regionais acontecem mensalmente e são desenvolvidos temas específicos que buscam subsidiar a prática profissional das/os trabalhadoras/es do SUAS. Ao longo de 07 anos de existência, o modo de funcionamento do GECCATS foi se aperfeiçoando ao ponto de contar com um regimento interno construído coletivamente, no qual se define as condições necessárias para o cumprimento dos objetivos do grupo: participação, representação, forma de desenvolvimento dos temas, comissões, comunicação, avaliação, entre outras. Para cada encontro é instituída uma comissão organizadora composta por representantes de dois municípios da região administrativa e da equipe da DRADS em forma de rodízio, que divide as responsabilidades na organização e realização de cada encontro. Esta dinâmica de condução de atividades coletivas já se traduz em processos democráticos de participação que agregam à nossa competência profissional. Os assuntos discutidos nos encontros são definidos a partir das demandas e necessidades emergentes da prática profissional cotidiana, apontadas pelos membros do grupo e avaliadas como prioritárias pela maioria das/os participantes. Apesar de utilizar a estrutura da DRADS, o grupo não oferece demais ônus financeiro para o estado. Conta com a participação e coordenação de três técnicas da DRADS, Renata, Talismara e eu, todas assistentes sociais, que incorporamos esta atividade como parte da rotina diária de trabalho. Também são disponibilizados os equipamentos necessários para os encontros e os municípios apoiam o grupo no fornecimento do lanche e nas eventuais contratações de especialistas. Contudo, considera-se fundamental agregar investimentos financeiros direcionados para potencializar as ações do grupo. É possível afirmar que o GECCATS traz repercussões positivas para toda a região, pois, os profissionais que atuam na assistência social, principalmente nos CRAS, ganharam um espaço onde podem aprimorar os conhecimentos e desenvolver um trabalho mais assertivo que pode culminar na prestação de serviços com mais qualidade para os usuários, levando em consideração que o trabalho da assistência social está fortemente apoiado na formação técnica e política do seu quadro de pessoal. E por outro lado e de um modo particular, nós, técnicas da DRADS, executamos o papel atribuído ao estado de fomentar capacitações de atualização técnica, além de pactuar e disseminar conteúdos para os trabalhadores do SUAS. (CNAS, 2013). Termino com uma frase citada no último dia 05 no 15º Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais/CBAS de Chico Science & Nação zumbi que faz todo o sentido neste processo de aprimoramento profissional “Comecei a pensar, que eu me organizando, posso desorganizar, que eu desorganizando, posso me organizar…” Bibliografia: ·         Brasil. Código de ética do/a assistente social. Lei 8.662/93 de regulamentação da profissão. – 10ª. Ed. rev. e atual. – [Brasília]: Conselho Federal de Serviço Social, [2012]; ·         ——–. Resolução CNAS Nº 4, de 13 de março de 2013. Institui a Política Nacional de Educação Permanente do Sistema Único da Assistência Social – PNEP/SUAS; ·         https://www.youtube.com/watch?v=ytnbrnvTzC4 *Tatiana Roberta Borges Martins Possui pós-graduação em Gestão Pública pela Universidade Federal de São Carlos – UFSCAR e graduação em Serviço Social pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (2004). Atualmente é Servidora Pública e Diretora Técnica I do Núcleo de Avaliação e Supervisão da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social – Diretoria Regional de Assistência e Desenvolvimento Social – DRADS Franca. Tem experiência na Gestão da Assistência Social/SUAS pela trajetória profissional em Órgão Gestor (municipal e estadual), CRAS e Conselhos, desde 2005. É instrutora habilitada pelo Ministério de Desenvolvimento Social