Sem luta anticapitalista e antirracista, o combate ao Trabalho infantil será uma constante mitigação do agravamento da pobreza

Dia Mundial contra o Trabalho Infantil É muito cedo, É muito triste e Muito covarde Cortar infâncias pela metade. “Qualquer criança menor de 14 anos que for encontrada mendigando fora da paróquia onde habita […] será enviada à escola de trabalho mais próxima, será fortemente açoitada e trabalhará até o pôr do sol […] Devem ser instaladas escolas de trabalho em todas as paróquias, e as crianças [pobres] entre 3 e 14 anos […] devem ser obrigadas a ir [para torná-las pessoas] […] sóbrias e industriosas [e, graças a seu trabalho,] o ensino e a manutenção de tais crianças durante o período não custará nada à paróquia. John Locke – Political Wrítings citado por : Várnagy, Tomás. O pensamento político de John Locke e o surgimento do liberalismo. Referência completa clique aqui Pensando aqui na campanha 2020 do Dia Mundial contra o Trabalho Infantil e sabe o que é muito triste? É saber que John Locke, considerado o pai do liberalismo, defendia trabalho infantil como educação e como formação de caráter, isso lá no século XVII e ainda hoje as políticas neoliberais e as medidas de austeridade defendem, perversamente, a mesma situação e este destino para as crianças e adolescentes pobres quando aprovaram as reformas trabalhista e previdenciária e quando vigorou a EC 95 (2016). Sabe-se que foram aprovações de projetos em disputa desde os anos 90. Na década seguinte o pacto federativo e social ganhou um fôlego e impôs avanços, mas o Locke mostra que a violência estrutural institucional é muito mais antiga e persistente. Então não se engane, o liberalismo de hoje sabe que o trabalho infantil é o destino para as crianças e adolescentes pobres, só que com roupagem humanizada. A lógica é certa, quanto mais desemprego, mais as crianças e adolescentes são e serão expostos a situações graves de trabalho precoce, assim como a várias outras violências e riscos. E quem são essas crianças e adolescentes? A maioria são as pretas. Trabalho infantil é mais uma violência, resultado do projeto de branquitude do País. É triste. É triste saber que trabalhadoras e trabalhadores da assistência social e de outras políticas sociais, acabam como agentes enxugadores de gelo ao atuar em programas e serviços que visam normatizar e manter essa roupagem humanizada do suposto cuidado pelo sistema violento. Não dá para enfrentar o trabalho infantil sem enfrentar o capitalismo e suas políticas neoliberais. Ou atuaremos para uma transformação dessa sociedade que já não dava certo muito antes da pandemia ou seguiremos sendo agentes pacificadores e distribuidores de falsas promessas esperanças. Lutar contra o trabalho infantil é lutar pela Revogação imediata da Emenda Constitucional 95 que congela os investimentos públicos por 20 anos. A pergunta que eu deixo aqui é: seremos parceiros de lutas pela mitigação dos efeitos do trabalho infantil ou seremos agentes de combate a esta violência estrutural? O caminho é com transformação social, sendo anticapitalista, antirracista e antifascista. Para começar a subverter, a campanha do Blog Psicologia no SUAS contra o trabalho infantil será essa: Acompanhe o BPS nas redes sociais (https://linktr.ee/psicologianosuas) Leia mais

A questão social como “pobreza”: crítica à conceituação neoliberal – livro

O conceito de pobreza é um desafio para nós psicólogas, e a quem me pergunta por onde deve começar a estudar quando inicia ou quer entender melhor o trabalho no SUAS, é comum eu responder: estude conceitos como pobreza, desigualdade social e política social. Por isso é com muita alegria que fecho, por este ano, esta seção de apresentação de livros com esta obra da Vivian Dominguez Ugá, Editora Appris. A questão social como “pobreza”: crítica à conceituação neoliberal Olha como este tema está no cenário atual 🙁 Apresentação do livro: A pobreza é termo de uso comum e de longa data. Contudo, diante da proliferação de recomendações de combate à pobreza, desde os anos 90, a atual utilização desse termo merece atenção, já que envolve não apenas um modo de percepção para o social, mas, sobretudo, a construção de um conceito que ajuda a recortar e interpretar a realidade e, a partir daí, incidir sobre ela. Assim, embora procure assumir um caráter puramente técnico, o atual tratamento da questão social como pobreza pressupõe uma visão de mundo social própria, que traz consigo significados e implicações. Editora Appris Ao mesmo tempo em que se enfatiza essa transformação do pobre num indivíduo mais completo, ressalta-se também um lado “político” para a questão. Recomenda-se que esses pobres devem-se organizar, devem ser “empoderados” (empowered), para que, assim, possam ter “voz” e “participar” em busca do que se considera seu o fim último dos pobres: “sair da pobreza”. Esta “participação” muitas vezes refere-se simplesmente ao levantamento das opiniões dessas pessoas definidas como “pobres” acerca de temas relativos à “pobreza”. Assim, uma vez implementadas todas as recomendações, os indivíduos pobres estariam prontos para competir e, assim, abrir-se-iam as condições para a expansão de suas “oportunidades”. Dessa maneira, a visão de mundo pressuposta parece ser mesmo a do neoliberalismo, que, com a ajuda do conceito de pobreza, procura abarcar a realidade contemporânea e propor medidas para transformá-la. pág 291 É um livro fruto da tese de doutorado (2008) – UERJ homônimo e a própria autora fala no livro que o texto manteve-se quase intocado, portanto, se você não pode ou não quer comprar o livro, aproveite para ler e estudar a tese, basta clicar aqui Eu quero muito terminar de estudar o livro, fazer fichamento e/ou resenha para publicar aqui no blog, porque nesse tempo que estudo este conceito eu ainda não tinha encontrado uma pesquisa tão completa e que pode ser muito aproveitada no nosso contexto da Assistência Social. Portanto, voltarei a falar desse livro por aqui!! VERSÃO IMPRESSA R$ 49,00 no site da editora, mas é bom você saber que o livro também pode ser comprado em outras lojas que vendem pela internet! Saiba mais sobre a Editora Appris: Instagram Facebook Ps. Livro recebido pela Editora Appris. A autora do blog não recebe comissão pela venda do livro. Boa leitura, ótimos estudos! Instagram do Blog: @psicologianosuas  Facebook: Blog Psicologia no SUAS Que 2020 seja produtivo e cheio de encontros!! Boas festas!

A Polícia das Famílias (Livro em pdf)

Disponibilizando para vocês, especialmente para quem leu o texto que publiquei recentemente aqui: Visita Domiciliar no SUAS, o livro A Polícia das Famílias em PDF. A intenção é que vocês leiam este livro antes do nosso próximo texto sobre Visita Domiciliar – parte II. E como o acesso a ele é por PDF (ele é de 1980), eu achei por bem disponibilizá-lo aqui. BAIXAR LIVRO ⇒ A-Policia-das-Famílias DONZELOT, Jacques. A polícia das famílias. Rio de Janeiro, editora Graal, 1980. Até breve e boa leitura!

O primeiro-damismo e a desprofissionalização como barreiras na consolidação do SUAS

Por  Tatiana Borges; Aline Morais; Lívia de Paula; Rozana Fonseca e Thaís Gomes Apesar de estar reconhecida enquanto política pública na Constituição Federal de 1988, a Assistência Social tardiamente passou a se constituir como direito social e dever do Estado, já que o seu histórico é fortemente marcado pela caridade, filantropia e voluntariado, ou melhor, é o histórico do ‘não direito’, do favor. É possível afirmar que foi com a implantação do SUAS, através da PNAS de 2004, que ocorreu um salto na profissionalização da assistência social, ou seja, contrapondo as práticas emergenciais de compaixão, de improviso e personalismos,  é o arcabouço normativo dos últimos 10 anos da política de assistência social que reforça ou exige a presença de equipes de referência interdisciplinares constituídas por servidores públicos para a intervenção no conjunto de expressões das desigualdades sociais, através de serviços e benefícios socioassistenciais. Dito de outra forma, o reconhecimento, através de ordenamentos institucionais e direcionamentos políticos, de que o atendimento com dignidade prestado à população exige condições de trabalho e profissionais qualificados nas dimensões teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa é recente. Assim como é novo o tratamento da Assistência Social como responsabilidade estatal, expressada através de seguranças indispensáveis ao desenvolvimento pleno dos cidadãos com a garantia de direitos e com o envolvimento efetivo de todas as esferas de governo. Muito embora este entendimento seja fruto de estudos muito anteriores ao SUAS, de embates e lutas históricas para o reconhecimento da política de Assistência Social como direito e de militância política de diversos segmentos da sociedade, bem como de profissionais, com destaque aos assistentes sociais, o movimento para a implantação deste sistema é ainda incipiente, pois temos mais um modelo do que um sistema propriamente instalado, o que não invalida, de forma alguma, os avanços reais conquistados. Avanços oriundos especialmente dos movimentos organizados de trabalhadoras/es e de usuários, seja na militância diária em seus equipamentos de trabalho ou em fóruns, grupos e conselhos destinados à discussões, deliberações e construções da política. O avanço do SUAS – mesmo que não esteja nivelado, pois a cobertura para os riscos sociais não é universalizada e há um descompasso entre as formas e o tempo histórico de incorporação desta política pela união, estados e municípios – é inegável, principalmente, pelo potencial, já demonstrado pelas pesquisas e pelos indicadores existentes, de impactar a existência de grupos de pessoas, atuando na proteção a vida, na prevenção da incidência de riscos sociais, na identificação e superação de desproteções sociais e na redução de danos. Ainda assim, o desafio cotidiano que nós, das diversas categorias profissionais – que hoje, graças ao conjunto normativo do SUAS, compõem a política de assistência social – enfrentamos é superar a tradição de práticas assistencialistas pautadas sempre pelo controle e adestramento das famílias e pela criminalização da pobreza como forma de manter “a ordem e o progresso” do país, bem como o poder sobre os pobres, tratando os como desvalidos, carentes e não como cidadãos ativos de direitos. Considerando que o primeiro-damismo é uma realidade em muitos municípios, fica mais evidente a necessidade de pautarmos criticamente este cenário, uma vez que agora há uma representação emblemática e carregada de retrocessos. O quanto o primeiro-damismo tem emperrado a consolidação no SUAS? Valeria um estudo, porque sabemos que ainda há uma distância entre a legislação e o modo como a Assistência Social é vista pela população, pelos seus dirigentes e gestores municipais. O que sabemos é que, em muitos municípios a realidade da política de assistência social é permeada por ações de cunho clientelista que se convertem em moeda de troca nos acordos político-partidários entre prefeitos e vereadores para garantir votos da população. A incidência destas práticas na política de assistência social culmina numa desarticulação e fragmentação da mesma, numa sobreposição de propostas, sem considerar o que já existe no SUAS, reduzindo as ações à ajudas e concessões pontuais da primeira-dama. Nós, profissionais que compomos o SUAS e que defendemos este modelo de política pública, trabalhamos em uma direção que tem o Estado como principal responsável pelo bem-estar social e assim tendo como competência a promoção da proteção social que, no âmbito do SUAS, se materializa por meio dos serviços e benefícios socioassistenciais. Nesta direção o Estado atua como agente executivo (PAIF e PAEFI, programas e benefícios), agente regulador (dos serviços socioassistenciais prestados por entidades e organizações sociais) e agente de defesa de direitos e da participação social e esta direção, que preza a assistência como um direito e não como uma benesse, nos faz posicionarmos contrárias/os às propostas que venham reforçar o primeiro-damismo, estatuto que representa tudo aquilo que procuramos romper, ou seja, com o clientelismo, com o cerceamento de famílias e com o  uso das pessoas que necessitam da assistência social para a promoção da imagem do político. O primeiro-damismo, a nosso ver, é a caricatura da negação do direito, uma vez que simboliza, de forma bastante clara, o lugar que governos baseados em assistencialismo reservam à população usuária do SUAS:  o lugar de quem deve agradecer ao político pela sua bondade, por sua benevolência. Por saber que nós, trabalhadoras/es do SUAS, nos constituímos como a “tecnologia básica” deste sistema, uma vez que “a mediação principal é o próprio profissional” (BRASIL, 2008), não podemos nos calar, pois o trabalho social que realizamos exige conhecimento, formação técnica e perfil e não é possível que para um cargo de condução de uma política pública o critério seja o casamento e não o currículo profissional ou concurso público. A qualificação do trabalho social com famílias é um grande marco na implantação do SUAS e em uma de suas dimensões há um conjunto de atribuições técnicas/os, que compõem as equipes de referência dos serviço socioassistenciais. Entre estas atribuições está o acompanhamento às famílias que se encontram em situação de vulnerabilidade e/ou risco social decorrente, dentre outros fatores, da precariedade de renda. Assim, as famílias beneficiárias de programas de transferência de renda são prioritárias para o acompanhamento social que se configura como a oferta de um serviço e não uma exigência ou

Erradicação do Trabalho Infantil: aspectos socioculturais como barreiras

 Considerando que 12 de Junho é o Dia Mundial e Nacional contra o Trabalho Infantil, eu criei uma LISTA com sugestões de materiais sobre Trabalho Infantil  e para apresentá-la, elaborei um texto com algumas ideias e provocações sobre o Trabalho Infantil, porque entre tantos problemas sociais e desafios que enfrentamos no dia a dia do trabalho no SUAS, este é um deles. O trabalho infantil é um problema de muitas e complexas dimensões, como: econômica, social, política, histórica e cultural. Compreendo que para se avançar com a erradicação do trabalho infantil, precisamos romper com uma das piores dimensões: a sociocultural. Esta se torna a mais difícil de romper porque envolve educação, formação cidadã e subjetiva dos indivíduos e consequente mente da coletividade.  A desigualdade social, como sabemos, não é objetiva e não pode ser considerada só pelas questões econômicas, porque perpassa pela discrepância no acesso e usufruto de TODOS os Direitos Humanos. A questão sociocultural,  torna-se uma barreira na implantação e implementação de ações de erradicação do trabalho infantil, quando os operadores/agentes públicos, privados e sociedade civil naturalizam a pobreza e os fenômenos da desigualdade social. Vou exemplificar com dois agentes: Muitos professores, desde o Ensino Fundamental e trabalhadores sociais (com formação de nível médio e superior), reproduzem o discurso que “é melhor trabalhar do que ser arruaceiros ou roubar”, “o trabalho educa e disciplina”, “eu trabalhei e não morri por isso”. Discursos que revelam a reprodução do aspecto cultural e social da naturalização e perpetuação da pobreza, além da incompreensão sobre os riscos mais imediatos aos quais as crianças e os adolescentes ficam expostos, como desproteção, evasão escolar ou baixo “rendimento”, violência sexual, aliciamento para o tráfico, atropelamento, mutilamentos, e de forma ampla, se mostram alheios aos impactos e consequências do trabalho precoce no desenvolvimento físico e psíquico. O Brasil ainda tem 3,2 milhões de crianças e adolescentes trabalhando (FNPETI) – Dados da PNAD de 2013. No mundo cerca de 168 milhões de crianças estão presas ao trabalho infantil – Dados do relatório World Report on Child Labour 2015 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Divulgado no O GLOBO (10/06/15). Como implantar ou implementar uma política na qual não se acredita? Se o trabalho infantil não fosse considerado crime, continuaríamos passivos diante deste cenário? Antes de condenar a família que leva os filhos para feira ou para a plantação de tomate, ou aplaudir um garoto (a) que estuda de manhã e vende picolé a tarde na praça da cidade, deve-se repensar as próprias convicções e lacunas no conhecimento, para ter condições de desfazer esse rastro de violência nossa de cada dia. Sobre este ponto da violência nossa de cada dia – longe de ser fatalista, mas sobretudo considerando os casos de violência que a proteção social de média e alta complexidade atendem, o ser humano é capaz de cometer atrocidades. Desde os primórdios e formação do que entendemos como sociedade hoje, existe violência entre os seres humanos. Os atos atrozes são imprevisíveis, por isso ficamos tão perplexos diante de crimes cometidos por pessoas consideradas “incapazes” de cometer tal ato. Esta reflexão é que me faz afirmar que o trabalho infantil é a pior forma de violência gerada pela sociedade. O ponto de ligação que tento tecer é que esta violência não é imprevisível, pelo contrário, é justamente o resultado da “canalhice” e incompetência do poder público, privado e desresponsabilização da sociedade civil. O cenário com tudo isso acima, reforçado com os aspectos socioculturais e históricos sobre o que é ser criança e adolescente, com o que cabe a e na pobreza e acrescentando a inabilidade com o trabalho intersetorial, continuará servindo de palco para a exposição e evidência das piores manifestações da desigualdade social. Acesse a Lista com indicação de produções para o combate ao Trabalho Infantil – <a rel=”noreferrer noopener” href=”http://<!– wp:html –> https://psicologianosuas.com/2015/06/14/sugestoes-de-filmes-documentarios-videos-educativos-legislacao-e-sites-sobre-trabalho-infantil/ Clique aqui Atualizado em junho de 2020