Desafios para a política de Assistência Social frente a pandemia – Covid-19*

A Psicologia na Política de Assistência Social[i] A psicologia está inserida na política de assistência social desde as mobilizações e elaborações iniciais dos marcos legais da Assistência Social. Antes do SUAS, os serviços de Ação Social contavam com a presença de psicólogas (os) nos serviços. Eles eram organizados por nichos, a partir das problemáticas e na prática não havia uma definição quanto a serviço ou programa e nem quanto a qual política pública pertencia essas ações.   Mas as psicólogas já estavam presentes nos serviços/programas que atendiam crianças e adolescentes em situação de violência – nos conselhos tutelares já tivemos muitas psicólogas atuando! Serviços para atendimento às mulheres vítima de violência; nos chamados asilos e abrigos, dentre outros programas sociais, geralmente pontuais. Mas é a partir da regulamentação da Política Nacional de Assistência Social – PNAS/2004 e da Norma Operacional Básica de Recursos Humanos – SUAS/2006 que temos um aumento sem precedentes desse campo de trabalho para as psicólogas (os). Superando a inserção preferencial postulada pela NOB-RH/SUAS, a psicólogas (os) passaram a compor as equipes dos serviços socioassistenciais de forma obrigatória a partir de 2011, através da resolução nº 17 do CNAS, a qual reconhece e elenca as profissões que fazem parte diretamente das equipes da rede socioassistencial. Esta inserção massiva, a qual ocorreu, historicamente simultânea, em diversas regiões do País, foi efervescente e ainda é terreno de muitas dúvidas, mas também de muitos acertos, é verdade.  Ainda vemos uma dificuldade dos gestores em entender a importância e contribuição da Psicologia social e comunitária, bem como em muitos profissionais que não conseguem dizer com segurança o que a Psicologia tem a fazer no SUAS. Pergunta, questão, sentimentos: se não fazemos atendimentos individualizados, somos menos psicólogas? Individualizados na perspectiva de debruçar sobre o sofrimento narrado individualmente. Lembrando que o sofrimento existe e existe pela condição de valer menos e a por ser oprimido. Condições que promovem estragos subjetivos e sociais e é por isso que nossa atuação tem como base a Psicologia social e comunitária, a Psicologia sócio-histórica, a Psicologia que visiona à emancipação e não à docilidade dos sujeitos. Vejo ainda que nestes 10 anos atuando direta e indiretamente no SUAS, e como o trabalho no Blog Psicologia no SUAS, que a Psicologia tem contribuído muito ao provocar a despatologização (o que não é feito somente por psi, vale lembrar) e a desculpabilização dos sujeitos pela condição de pobreza. Mesmo que muitas profissionais contribuem sem a intencionalidade desejada, o imperativo das seguranças a serem afiançadas, direciona para isso e em algum momento, quem realmente fica no SUAS, estuda e começa a questionar este campo de trabalho, entende que nossa função não é normatizar, muito menos docilizar as famílias e os sujeitos que necessitam de proteção social. Desafios para a política de assistência social frente a pandemia – Covid-19 Estamos vendo um cenário de publicização do que é a Assistência Social, mesmo que não seja intencional, mas é isto que estamos vendo: Assistência social=cesta básica. Corremos um risco de retroceder, retroceder não pelo fato das pessoas terem acesso ao alimento direto, isso, por si só, não é assistencialismo. Elas precisam comer sim, é um direito fundamental, mas o que não precisamos é ainda utilizar meios retrógrados e passível de muitos erros e usos indevidos na trajetória do acesso. Eu, sinceramente, não espero um NOVO mundo pós pandemia, haverá muita mudança sim, do ponto de visto do uso da tecnologia, de novas normas de biossegurança, da geopolítica, mas a concentração de renda se perpetuará e com isso as desproteções sociais permanecerão e se ampliarão de maneira muito acentuada.  Não chegamos próximo do fim do capitalismo e ele ainda fará muitas vítimas. O que já vemos e veremos com a pandemia é a exposição das desigualdades que são alimentadas pelo sistema. Portanto, não será surpresa que essas mudanças, inevitáveis, pós pandemia, continuarão cuidando mais e melhor daqueles que mais têm recursos financeiros. Eu espero que possamos reconectar a PNAS com a proposta de emancipação social, com a urgência de desnaturalizar as desigualdades sociais. Mas não vamos fazer isso com grupos, com ações coletivas que mais funcionam para números e repasses financeiros. Estas ações coletivas precisam ter o cunho ético-político da transformação social, aqui não falo da transformação e mudança do sistema, ainda, porque essas famílias precisam saber que elas são esmagadas diariamente pelo sistema vigente e sim, elas valem muito pouco ou nada no capitalismo. Passou da hora de nós psicólogas, trabalhadores dos Suas no geral, rompermos com a lógica de normatização das famílias e dos indivíduos. E é nesta frente de trabalho que acredito que vamos conseguir de vez, romper com o velho na assistência social, romper com um labor cristalizado e que só serve à manutenção da ordem vigente.  A crítica pelo artesanato feito hoje como oficinas com mulheres se dá porque são atividades sem fundamentação teórica. Há uma repetição do que se fazia nas igrejas e nos centro comunitários há várias décadas pré SUAS. Ou seja, não houve ainda um alastramento da profissionalização dos serviços e atividades ofertados para as famílias e indivíduos – de forma consistente. Mas vale aqui reforçar a ressalva de que não é uma generalização absoluta, porque com um leve esforço conseguimos identificar e reconhecer que temos ações pautadas em conhecimento teórico-técnico e político, principalmente em cidades de maior porte e onde o SUAS está com as áreas essenciais de gestão implantadas e em funcionamento. Como uma saída para superarmos essas velhas práticas destituídas de sentido, eu coloco como proposição elevarmos a categoria do artesanato, da costura, porque o problema não é se utilizar dessas técnicas, pelo contrário, porque podemos ser, inclusive, facilitadores à mudança do valor sociocultural e histórico dos trabalhos manuais.  Assim, para exemplificar, cito duas possibilidades de “bordado e costura”: o trabalho do coletivo de mulheres do Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB que usam uma técnica de bordado chileno, chamado arpilleras – Aqui tem uma postagem onde divulgo este trabalho e o filme produzido pelo coletivo de mulheres do MAB,

Série Desafio do diferencial científico-profissional no SUAS

Sobre a Série Desafio do diferencial científico-profissional no SUAS Hoje inicio uma série referente a desafios que serão lançados no Instagram do Blog (@psicologianosuas) O nome da série é “Desafio do diferencial científico-profissional no SUAS”, onde o objetivo é revelar malfeitos em atendimentos no SUAS com provocação de diálogos para problematização e proposição de mudança de perspectiva para a profissionalização e o aprimoramento do Trabalho Social com Famílias – TSF. Tenho usado o Instagram do Blog para atualização mais constantes. A interação está tão potente que tem desencadeado várias ideias para textos. E assim, fica definido o formato dessa série: periodicamente será lançado uma situação exemplo (sempre no Instagram e Facebook), onde será solicitado comentários e análises dos colegas e posteriormente vem a ideia final para o texto-resposta. Por que realizar esta série de Desafios? O exercício é promover a identificação de conceitos teóricos e técnicos a respeito do atendimento que, claramente, foi inadequado. Provocar sobre a necessidade de se sair do automatismo das ações para conseguir ampará-las em abordagens teóricas e nas recomendações técnicas dos serviços. Assim, penso que um bom exercício para se manter propositivo, teórica e tecnicamente, é não banalizar a rotina do trabalho. Rotina pode ter conotação pejorativa, não é o caso aqui. Poderia então falar em processos de trabalho, mas escolho ‘rotina’ porque é onde as armadilhas capturam o profissional. Captura-os nos momentos da pressa, da correria, da iminência ou da necessidade de apagar um incêndio. Estamos sendo o tempo todo acionados, mas e quanto ao circuito da rotina diária ou agenda anual, estamos abastecidos pelas teorias e técnicas que aprendemos e nos conferiram o lugar de profissionais? Quantas vezes já ouvi de um profissional de nível médio (motorista, orientador, facilitador) que queria fazer serviço social ou psicologia (confesso que serviço social ganha disparadamente) porque eles poderiam ganhar mais fazendo o mesmo que já faziam! O motorista é porque acha o trabalho social fácil.😱 Essa fala sempre me deixa reflexiva. O técnico de nível médio -TNM querer estudar é maravilhoso, mas o assustador é saber que ele não consegue diferenciar o fazer dele do fazer do profissional de nível superior. O susto não é porque o TNM equipara os fazeres, mas é porque o fazer do TNS não foi capaz de explicitar as diferenças. Poderia falar mais sobre outros desdobramentos provocados por essa percepção nebulosa no ambiente de trabalho, mas o foco aqui é responder ao desafio problematizando se os profissionais de nível superior estão conseguindo impedir que sejam capturados pelos malfeitos durante a rotina de trabalho. É comum escutar que os profissionais estão cansados de teorias e orientações técnicas, querem mesmo é saber sobre a prática. Mas como haverá de ter prática crítica e propositiva sem teoria? Minha hipótese é que muitos acham que estão cansados porque na rotina só conseguem enxergar a demanda bruta e a imposição para enfrentarem, de imediato, as urgências do dia, da semana. É preciso lembrar que elas não são novas! Olha que interessante: Diante de uma situação urgente (estado de desproteção social persistente), a gestão ou a rede cobra uma intervenção como se a situação fosse uma emergência, ou seja, algo imprevisto e que requer reposta imediata. Portanto, para as demandas urgentes, as mais comuns na rotina, que as repostas sejam pautadas no conhecimento profissional e no planejamento. Acredito que com esses argumentos, fixo-os à práxis e ao posicionamento ético-político em toda intervenção profissional no SUAS. Então, seguindo à minha “resposta” ao desafio proposto, questiono: Na rotina, na objetividade das ações demandadas, como identificar se se está cumprindo o esperado científica e profissionalmente? Uma importante estratégia é realizar estudos e reuniões técnicas para avaliar as ações e ter assessoramento/supervisão. Desafio #01 – Conceitos para qualificar o Trabalho Social com Famílias Vamos então ao desafio discorrendo sobre aos conceitos que considero subjacentes a este atendimento exemplificado, sabidamente, equivocado: Território e Diagnóstico Socioterritorial Para que? Conhecer o recorte geográfico e a cobertura de transporte coletivo na área de abrangência do CRAS. Não pontuarei as demais dimensões de território porque o foco do exemplo é a distância geográfica. Trabalho Social com famílias pautadopeloDiagnóstico Socioterritorial, uma vez que é um instrumento capaz de fornecer esse subsídio para intervenções pautadas na realidade do território.   Plano de Acompanhamento Familiar – PAF Por que? Família em estado de vulnerabilidade de renda, com demanda para cesta básica deve estar em acompanhamento familiar (salvo se haver recursa). Lembrando que acompanhamento sem plano, provavelmente, está mais para atendimentos pontuais! Com o PAF em andamento e norteando as ações, a equipe poderia lançar como estratégia os atendimentos domiciliares, considerando a ausência de transporte e precariedade de renda. E provavelmente, com o plano, a situação de insegurança alimentar já teria sido considerada logo nas primeiras intervenções. Acolhida Esta acolhida mencionada no exemplo não é a ação essencial do PAIF. Por quê? Chamei de acolhida para pontuar a confusão que se faz entre a Acolhida, uma ação postulada como uma metodologia de assistência/atendimento e a acolhida que é a maneira como TODOS os membros da equipe recebem os usuários na unidade ou como interagem com os mesmos na comunidade (ter postura atenciosa e empática. É ter genuíno interesse pela pessoa/família que está sendo atendida). No exemplo, ao apontar que a mulher já era usuária da unidade, subentende-se que a acolhida (como ação do PAIF) já ocorrera. Mas é bom se atentar que a acolhida não acontece uma única vez, está posto sumariamente porque o desafio requer um fechamento mais objetivo – Sugiro a leitura dos conceitos abordados nos cadernos de orientações dos serviços e na PNAS P.S. Outras avaliações são possíveis para este exemplo apresentado. Portanto, caso queira acrescentar suas análises, saiba que será de extrema valia conhecê-las. Instagram do Blog: @psicologianosuas Facebook: Blog Psicologia no SUAS _______________________________________________ Atualizado em: 21/07/2019

Ações e atribuições das equipes de referência do CRAS/PAIF

Repostei na página no facebook, há alguns dias, uma síntese com as competências que NÃO fazem parte das atribuições do CRAS. Percebi que este tipo de Post ajuda os técnicos a revisitarem ou conhecerem os materiais de orientações sobre os serviços, ajudando a subsidiar a elaboração dos relatórios de atendimento/acompanhamento ao responderem as solicitações com demandas que não fazem parte da política de assistência social, no caso aqui, da proteção social básica. Por sugestões dos leitores lá na fanpage e por considerar importante também destacar o que se faz nos serviços do CRAS (Depois publico os destaques do CREAS)  trago hoje um recorte com as atribuições das equipes de referência conforme relacionado no Caderno de Orientações Técnicas do CRAS/MDS de 2009 e as cinco ações do PAIF apontadas no caderno mais recente do PAIF, de 2012. Atribuições: Acolhida, oferta de informações e realização de encaminhamentos às famílias usuárias do CRAS; Planejamento e implementação do PAIF, de acordo com as características do território de abrangência do CRAS; Mediação de grupos de famílias dos PAIF; Realização de atendimento particularizados e visitas domiciliares às famílias referenciadas ao CRAS; Desenvolvimento de atividades coletivas e comunitárias no território; Apoio técnico continuado aos profissionais responsáveis pelo(s) serviço(s) de convivência e fortalecimento de vínculos desenvolvidos no território ou no CRAS; Acompanhamento de famílias encaminhadas pelos serviços de convivência e fortalecimento de vínculos ofertados no território ou no CRAS; Realização da busca ativa no território de abrangência do CRAS e desenvolvimento de projetos que visam prevenir aumento de incidência de situações de risco; Acompanhamento das famílias em descumprimento de condicionalidades; Alimentação de sistema de informação, registro das ações desenvolvidas e planejamento do trabalho de forma coletiva. Articulação de ações que potencializem as boas experiências no território de abrangência; Realização de encaminhamento, com acompanhamento, para a rede socioassistencial e para os serviços setoriais; Participação das reuniões preparatórias ao planejamento municipal ou do DF; Participação de reuniões sistemáticas no CRAS, para planejamento das ações semanais a serem desenvolvidas, definição de fluxos, instituição de rotina de atendimento e acolhimento dos usuários; organização dos encaminhamentos, fluxos de informações com outros setores, procedimentos, estratégias de resposta às demandas e de fortalecimento das potencialidades do território. Pág. 64  Considerando o Caderno de Orientações Técnicas do PAIF – Vol Il, podemos dizer que estas atribuições estão contidas nas 05 cincos ações do PAIF, as quais estão diretamente conectadas aos objetivos deste serviço. Veja a imagem do quadro síntese – Pág. 15 Aproveite para ler ou reler os dois cadernos citados: Baixar: Caderno de Orientações Técnicas Centro de Referencias de Assistência Social – CRAS 2009 – BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional de Assistência Social. Orientações Técnicas Centro de Referência de Assistência Social – CRAS. Brasília, 2009. Baixar: Caderno de Orientações técnicas sobre o PAIF – Vol II – 2012 – BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Secretaria Nacional de Assistência Social. Orientações Técnicas sobre o PAIF – Volume 2. Brasília, 2012. Para acessar outros cadernos e materiais sobre o CRAS, clique AQUI Boa leitura! 🙂