No penúltimo Post da série “O que é o CRAS segundo o Facebook”, vou tratar hoje dos discursos acerca dos idosos, públicos do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos para pessoa idosa.
Conforme já provoca o título deste post, quero convidar você a repensar essa ideia de que a velhice é a melhor idade. Então a vida começa aos 60, quem foi que disse?
Mas já disseram que a vida começa aos quarenta. Quem foi que apagou as primeiras quatro décadas? “Quem foi que disse que a vida começa aos quarenta? (Biquini Cavadão – Zé ninguém)
É compreensível que o termo “Melhor idade” seja reproduzido desmedidamente (e não me refiro apenas aos CRAS, CREAS, mas também a outras instituições, como reproduziram nas últimas semanas os perfis no facebook do Senado e do CNJ) porque soa afável e demonstra boas intenções daqueles que trabalham com este público nos serviços públicos ou privados. Mas sabemos que a bondade e a boa intenção não são garantias de um trabalho social capaz de romper com o assistencialismo e promover processos emancipatórios do sujeito.
Tratar a velhice como a melhor idade é um romantismo raso que desqualifica a vida dessas pessoas e que tenta esconder as agruras do que significa ser velho numa sociedade que insiste que só há beleza e produção na juventude.
Olha como caímos nas ciladas dos discursos. Quando tratamos os idosos como viventes da melhor idade estamos justamente banalizando sua vida atual, é como se o idoso deixasse sua bagagem para trás e entrasse desvestido em um portal onde ser velho significa viver no paraíso. Mas neste paraíso ele deixa de ser sujeito para se tornar uma massa, um coletivo.
E os desejos, afetos, escolhas, projetos, sexualidade, sexo, trabalho, mobilização social, participação e inúmeras expressões da subjetividade? Isso é coisa da fase ruim da vida! No paraíso o que eles querem mesmo é dançar um forró e jogar dominó. É bom isso, assim eles esquecem as dores, sabe aquelas dores que andam? Que a cada hora estão numa parte do corpo? Isso é do idoso.
Há aqueles idosos que se queixam desse “paraíso”, reclamam que é sempre o mesmo CD, o mesmo lanche, ou que faltou açúcar no café. Como pode? Ah, esses são os ranzinzas!
Lembra que eu escrevi nos textos anteriores sobre a diferença de um trabalho social feito por profissionais com formação e daquele feito antes do SUAS, onde o trabalho (em sua maioria) era pontual e sem embasamento teórico, técnico e metodológico? É justamente esse ponto que me convoca a refletir sobre a reprodução de discursos equivocados por profissionais que deveriam pensar e agir diferente, criando novas formas de ver, compreender, tratar e trabalhar com os idosos.
Nesta altura do texto você pode questionar: mas que alarde por conta de um termo! – se isso acontecer não fui capaz de provocar a reflexão esperada, mas quero reforçar que nossa prática é resultado do nosso discurso. Se o discurso não revela aliança com a emancipação, autonomia e protagonismo, como ser agente ético e político de mudança?
Portanto, não é mais ético e construtivo deixar que cada um diga qual é ou qual foi sua melhor idade?
No próximo e último texto desta série, farei sugestões de algumas formas mais assertivas de divulgação dos serviços do CRAS, CREAS, SCFV através do Facebook.
Update
Para ler todos os textos desta série, clique nos links:
Bom Dia Rozana,
Você poderia publicar um Artigo abordando a Política do CCI (Centro de Convivência do Idoso) enquanto proposta que complementa o SCFV e não concorre e nem elimina já que a Política do CCI está embasada na PNI e no Estatuto do Idosos.
Muito obrigado
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Parabéns Rosana pela iniciativa. É essencial que um Blog como o seu aborde o tema da autonomia como algo central na política do SUAS.
Infeliz-mente ainda nos dias atuais é bem comum uma enorme infantilização das relações com o público IDOSO.
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Obrigada, Valdemar!
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Parabéns Rosana, abordar a autonomia dos idosos é algo emergente em nossa sociedade que frequentemente infantiliza tanto as relações como as práticas profissionais com as pessoas idosas.
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Muito boa sua reflexão fiz uma viagem em minhas duas semanas e meia enquanto gerente de um CRAS. É um desafio diário.
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Oi Felícia,
Obrigada por comentar!
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Hoje completo exatamente um ano de trabalho no CRAS. A cada dia mais me vejo confrontada por essas questões, cheia de anseios, dúvidas e desejos de fazer o melhor, contudo sinto-me a cada dia menos preparada.
De um lado a própria formação acadêmica que não nos dá a base necessária e nos fragiliza enquanto futuros trabalhadores, sendo também o pouco conteúdo teórico um fator complicador. A outra questão é justamente do que este texto específico fala: o senso comum, aquilo que sempre foi feito e que ninguém deseja mudar e deixar o lugar comum, pré-estabelecido.
Hoje durante uma conversa a respeito de como seria a comemoração do Dia do Idoso, sugeri que fosse selecionado um filme com intuito de reflexão e uma atividade alternativa, a fim de que pudéssemos ofertar algo diferente (não sei se é a melhor opção, mas só gostaria de uma possibilidade nova). Minha surpresa foi a resposta de toda a equipe: “ah não, eles não gostam. Eles gostam de forró, para que fazer isso? A gente tem que agradar eles”. Prontamente respondi que não estamos aqui para agradar ninguém e sim proporcionar alternativas a realidade e uma forma de ofertar direitos e cidadania, contudo foi novamente dito que “eles são velhos, nunca mudarão, não temos como ensiná-los a gostar de nada”. Minha argumentação seguinte foi que eles são idosos e continuam seres pensantes, ativos, atuantes e não podemos simplesmente aceitar um estigma dado pela sociedade de que eles são assim e pronto. Responderam-me: “não há como mudá-los. Eles vem aqui na sexta-feira para se divertir”. Me calei.
Se alguém tivesse me dito que após cinco anos e meio de faculdade minha função seria divertir idosos, acho que teria escolhido um caminho diferente.
Escrevo aqui como um desabafo e agradeço o espaço dado para dar voz as nossas dificuldades. E gostaria também de saber outras opiniões sobre isso. O que pensar? O que fazer?
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Cássia,
Seu comentário me encantou, me senti feliz e representada… vibrei com cada linha. Até a parte do “me calei” eu entendo, porque as coisas não mudam com uma intervenção ou duas, mas tenho certeza que suas colocações provocarão mudança, é preciso persistir. A equipe está com as ideias tão cristalizadas que não teve condições de ESCUTAR você, e pra quebrar o velho/o instituído leva tempo.
Obrigada por compartilhar essa experiência conosco!
Gd abraço
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Que bom que isso de alguma forma foi entendido como algo bom. Me peguei pensando: será que exagerei? É isso e pronto? Mas mesmo com a sensação de que não devo, que nunca me ouvirão, simplesmente não consigo deixar de intervir, de buscar fazê-los pensar fora da caixinha.
Uma hora qualquer alguém me escutará, é necessário acreditar!
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Mas que essa atividade do filme de faze-los repensar não fique somente motivadas pela comemoração do dia dos idosos, sei que a fala dos colegas de trabalho foi algo bastante expressivo de como lidam com a velhice e com o trabalho na assitencia social, mas que bom que os idosos tem você, uma profissional preocupada com uma questão que vai alem de divertir os idosos. o importante é que você consiga fazer, não importa se no dia do idosos ou em algum outro dia.
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Olá Rozana Fonseca, muito interessante seu texto e concordo com sua argumentação, penso que o estigma e a pior forma de exclusão, assim agir diferente, zelando e respeitando essas pessoas que trás consigo experiencias de vida valiosas.
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Obrigada por comentar, Ilma! um abraço
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Para quem tem mais de 65 anos
Ivone Boechat (autora)
1 – Tome posse da maturidade. A longevidade é uma bênção! Comemore! Ser maduro é um privilégio; é a última etapa da sua vida e se você acha que não soube viver as outras, não perca tempo, viva muito bem esta. Não fique falando toda hora: “estou velho”. Velho é coisa enguiçada. Idade não é pretexto para ninguém ficar velho. Engane a você mesmo sobre a sua idade, porque os psicólogos dizem que se vive de acordo com a idade declarada!
2 – Perdoe a você antes de perdoar os outros. Se você falhou, pediu perdão? Deus já o perdoou e não se lembra mais. Mas você fica remoendo o passado… Não se importe com o julgamento dos outros. Só há dois times no Universo: o do Salvador e o do acusador. Neste último você sabe quem é goleiro. Continue no time do Salvador.
3 – Viva com inteligência todo o seu tempo. Viva a sua vida, não a do seu marido, dos filhos, dos netos, dos parentes, dos vizinhos… Nem viva só pra eles, viva pra você também. Isto se chama amor próprio, aquilo que você sacrificou sempre! Nunca viva em função dos outros. Faça o seu projeto de vida!
4 – Coma muito menos; durma o suficiente; não fique o dia inteiro, dormindo, dando desculpa de velhice. Tenha disciplina. Fale com muita sabedoria. Discipline sua voz: nem metálica, nem baixinha; seja agradável!
5 – Poupe seus familiares e amigos das memórias do passado. Valorize o que foi bom. Experiências caóticas, traumas, fobias, neuroses, devem ser tratadas com o psicoterapeuta. Não transforme poltrona em divã, ouvido em descarga.
6 – Não aborreça ninguém com o relatório das suas viagens. Elas são interessantes só pra quem viaja. Ninguém aguenta ouvir os relatórios e ver fotografias horas e horas. Comente apenas o destino e a duração da viagem, se alguém perguntar. Aprenda a fazer uma síntese de tudo, a não ser que seus amigos peçam mais detalhes. Se alguém perguntar mais alguma coisa, seja breve.
7 – Escolha bons médicos. Não se automedique. Não há nada mais irritante do que um idoso metido a receitar remédio pra tudo o que o outro sente. Faça uma faxina na sua farmácia doméstica.
8 – Não arrisque cirurgias plásticas rejuvenescedoras. Elas têm prazo curto de duração. A chance de você ficar mais feio é altíssima e a de ficar mais jovem é fugaz. Faça exercícios faciais. Socorra os músculos da sua face. Tome no mínimo oito copos de água por dia e o sol da manhã é indispensável. O crime não compensa, mas o creme compensa!
9 – Use seu dinheiro com critério. Gaste em coisas importantes e evite economizar tanto com você. Tudo o que se economizar com você será para quem? No dia em que você morrer, vai ser uma feira de Caruaru na sua casa. Vão carregar tudo. Não darão valor a nada daquilo que você valorizou tanto: enfeites, penduricalhos, livros antigos, roupas usadas, bijuterias cafonas, ouro velho… prataria preta, troféus encardidos, placas de homenagens. Por que não doar as roupas, abrir um brechó ou vender todas as suas bugigangas, apurar um bom dinheiro e viajar?
10 – A maturidade não lhe dá o direito de ser mal educado. Nada de encher o prato na casa dos outros ou no self-service (com os outros pagando); falar de boca cheia, ou palitar os dentes na mesa de refeições (insuportável).
11 – Só masque chiclete sem testemunhas. Não corra o risco de acharem que você já está ruminando ou falando sozinho.
12 – Aposentadoria não significa ociosidade. Você deve arranjar alguma ocupação interessante e que lhe dê prazer. Trabalhar traz muitas vantagens para a saúde mental, além do dinheiro extra para gastar, também com você.
13 – Cuidado com a nostalgia e o otimismo. Pessoas amargas e tristes são chatíssimas, as alegres demais, também. Elogie os amigos, não fique exigindo explicações de tudo. Amigo é amigo.
14 – Leia. Ainda há tempo para gostar de aprender. A maturidade pode lhe trazer sabedoria. Coloque-se no grupo sempre pronto para aprender. Não se apresente em lugar nenhum dizendo: sou muito experiente!
15 – Não acredite nas pessoas que dizem que não tem nada demais o idoso usar roupas de jovens, cuidado. Vista-se bem, mas com discrição. Cuidado com a maquiagem, se for pesada, você vai ficar horrível.
16 – Seja avó do seus netos, não a mãe nem a babá. Por isso nem pense em educá-los ou comprometer todo o seu tempo com as tarefas chatas de ir buscar na escola, levar a festinhas, natação, inglês, vôlei… Só nas emergências. Cuidado com aquela disponibilidade que torna os outros irresponsáveis.
17 – Se alguém perguntar como vão seus netos, não precisa contar tuuuuuuuudo! Evite discorrer sobre a beleza rara e a inteligência excepcional deles. Cuidado com a idolatria de neto e o abandono dos filhos casados…
18 – Não seja uma sogra chata. Nunca peça relatório de nada. Seu filho tem a família dele. Você agora é parente! Nunca, nunca, nunca mesmo, visite seus filhos sem que seja convidado. Se o filho ligar pra você, não diga: ah! lembrou finalmente da sua mãe? É melhor dizer: Deus o abençoe meu filho.
19 – Cuidado em atender ao telefone: se a pessoa perguntar como você vai e você responder “estou levando a vida como Deus quer”; “a vida é dura”; “estou preparando a partida”; “estou vencendo a dureza”; você vai ver que as ligações dos amigos e dos parentes vão rarear, cada vez mais.
20 – A maturidade é o auge da vida, porque você tem idade, juízo, experiência, tempo e capacidade para se relacionar melhor com as pessoas. Então delete do seu computador mental o vírus da inveja, do orgulho, da vaidade, promiscuidades, cobranças, coisas pequenas e frustrantes para tomar posse de tudo o que você sempre sonhou: a felicidade.
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Ótimo texto!! A sua inquietação despertou em mim uma reflexão. Fico grata por você dividir sua experiência de forma tão generosa! Um abraço
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Obrigada, Andréia.
Compartilhar essas ideias e experiências me fortalece a cada dia como uma eterna aprendiz! obrigada por me dar esse retorno. Abs
Um abraço
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Maravilha de texto, Rozana! Continue semeando inquietações para que possamos refletir sobre nossas práticas! Abraços!
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Obrigada por comentar, Polyana. Participações como a sua me motivam a continuar escrevendo e a manter este espaço de encontro e trocas! Muito grata
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